Correio Popular, em 15/02/2014
Horário de Verão acaba, mas calor e estiagem recordes continuam — e devem aumentar consumo

A usina de Salto Grande, uma das três pequenas centrais hidrelétricas da CPFL Renováveis: geração de energia teve que ser interrompida por causa do baixo volume de água (Foto: Divulgação)
O Horário Brasileiro de Verão termina hoje. À meia-noite, os relógios devem ser atrasados em uma hora. Mas termina num momento nem um pouco confortável: a estiagem recorde diminuiu drasticametne o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas nas regiões Sul e Sudeste – e o setor energético está preocupado com os efeitos no forneci- mento de energia, já que o objetivo do Horário de Verão era justamente permitir um consumo menor.
Embora representantes do governo acreditem que é “baixissíma” a probabilidade de desabastecimento de energia, especialistas e estudiosos têm uma visão mais crítica sobre a condição real do sistema.
O calor intenso contribuiu para reduzir a economia de energia neste ano durante o período especial. Na área da CPFL Paulista, a economia durante o Horário de Verão (entre o final de 2013 e o início de 2014) foi de 55.838 MWh – volume suficiente para abastecer Campinas durante cinco dias.
No ano anterior, contudo, o resultado foi de 79.100 MWh, o que atenderia Ribeirão Preto por 15 dias. A região de abrangência da concessionária é composta por 234 cidades do Estado de São Paulo.
O balanço da empresa aponta que a queda na demanda no horário de pico (das 18h às 21h) foi de 1,72% nessa última edição, contra 4% no ano anterior.
Na área de concessão da Elektro, que se estende por 228 municípios paulistas e do Mato Grosso do Sul, a economia foi de 31 GWh, que permitiria abastecer Limeira por seis dias. No ano anterior, o volume foi de 30 GWh. De acordo com a empresa, no horário de ponta da demanda, a redução no consumo foi de 4,5%.
O gerente de Operações da CPFL Energia, Rodrigo de Vasconcelos Bianchi, afirmou que o Horário de Verão foi criado com o objetivo de reduzir o consumo com iluminação e educar a população sobre o uso racional de energia elétrica.
“Os sistemas de iluminação pública e também das residências estão a cada dia mais eficientes e consumindo menos energia. Mas neste ano, com o intenso calor, um outro fator influenciou no consumo de energia durante o Horário de Verão: o uso constante do ar-condicionado. Os dois fatores se refletiram, embora em direções ostas, no volume de energia economizado durante o período especial”, disse.
O gerente de Operações da companhia comentou que a queda do consumo foi menor este ano do que em 2012. “O resultado foi influenciado pelo forte calor. O Horário de Verão já foi incorporado na cultura das pessoas e é importante para conscientizar sobre o uso racional de energia elétrica”, salientou. Bianchi observou que a ponta de consumo foi deslocada para o período das 14h às 17h em decorrência do calor.
“Aumentou muito o uso de ar-condicionado nesse horário”, pontuou. Ele acredita que em breve o governo irá reanalisar os benefícios do Horário de Verão. “Somos favoráveis à manutenção do regime especial para a redução do consumo e também pelos impactos na qualidade de vida. As pessoas ficam mais dispostas a se exercitarem e realizarem atividades de entretenimento e lazer ao ganharem uma hora a mais de claridade no final do dia”, afirmou.
Bianchi disse que o sistema elétrico brasileiro é “muito robusto e seguro”, e que “está preparado para suportar a atual demanda de consumo. É certo que vamos precisar usar as termelétricas para complementar o sistema formado pelas hidrelétricas, mas não vejo risco de desabaste- cimento”.
Estiagem
O especialista do Climatempo, Alexandre Nascimento, afirmou que não há mais espaço climatológico para reverter a situação crítica dos sistemas de abastecimento de água.
“Este é o terceiro ano que temos uma redução no volume de chuvas durante o Verão. A diferença é que em 2014 a situação está fora dos padrões e a seca bateu recordes históricos”, comentou. Ele disse que as chuvas esperadas para março e abril não chegarão em volume suficiente para recuperar as represas de abastecimento de água e nem os reservatórios das hidrelétricas.
Com a estiagem em pleno Verão, o sistema elétrico nacional está usando as usinas térmicas para suprir a demanda de consumo de energia elétrica no País. O acionamento dessas usinas vai custar caro para o contribuinte. A saída encontrada pelo governo foi o empréstimo de recursos do Tesouro para as empresas do setor.
Os especialistas afirmaram que para manter o fluxo será preciso arrecadar mais. Em um segundo momento, a conta será repassada com o aumento das tarifas. “O custo das térmicas é bem maior que o das hidrelétricas”, disse o diretor da Associção Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Storfer.
Setor acendeu a luz amarela, diz especialista
O especialista da consultoria L.O. Baptista-SVMFA, Alexei Vivan, afirmou que o setor elétrico brasileiro acendeu a luz amarela.
“Hoje, todas as térmicas estão em operação. Os reservatórios de água das usinas hidrelétricas estão em um nível muito baixo. E se não chover, há risco sim de desabastecimento de energia. Agora, estamos dependendo das chuvas para garantir o abastecimento de energia nos próximos meses”, disse.
Para ele, o governo deve planejar o sistema para permitir a ampliação da participação de outras fonte de geração de energia.
O coordenador da Divisão de Sustentabilidade da Biomassa e Bioenergia do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), Reynaldo Luiz Victória, também defendeu a diversificação da matriz energética brasileira.
“A coogeração de energia com a biomassa da cana-de-açúcar é uma alternativas para o País. É necessário uma política pública de incentivo a mais fontes limpas e renováveis”, disse.