IQ/Intel em 20/10/2016
LINK: https://iq.intel.com.br/sirius-o-novo-acelerador-de-eletrons-brasileiro/
Sirius, o novo acelerador de elétrons que está sendo construído no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, em Campinas (SP), promete elevar o patamar da ciência produzida no Brasil e para o Brasil.
A quase 100 km da capital, São Paulo esconde um verdadeiro tesouro da ciência e da tecnologia nacional. Esconde não porque deseja, mas porque para grande parte da população brasileira o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, CNPEM, como é chamado, ainda é pouco conhecido. Por enquanto. Se hoje Campinas responde por pelo menos 15% de toda a produção científica nacional, sendo o terceiro maior polo de pesquisa e desenvolvimento do País, nos próximos anos a tendência é só melhorar. A construção do Sirius, um acelerador de elétrons de quarta geração, promete colocar o Brasil não apenas à frente de muitos outros países no que diz respeito à fonte de luz síncrotron, mas também sob todos os holofotes.
De longe, ou em fotos aéreas, a aparência circular pode até enganar, mas o Sirius não é um novo estádio de futebol, mas sim uma nova fonte de luz síncrotron, um acelerador de partículas cíclico no qual um campo elétrico é responsável pela aceleração das partículas e um campo magnético é responsável pela mudança de direção das partículas. O Sirius é um projeto do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que integra o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), organização social ligada ao governo federal, composto por outros três laboratórios: Laboratório Nacional de Biociência, Laboratório Nacional de Cîencia e Tecnologia do Bioetanol e Laboratório Nacional de Nanotecnologia.
Ainda em construção e previsto para abrir aos pesquisadores em 2018, o Sirius é composto por um conjunto de aceleradores de elétrons, por estações experimentais — chamadas de linhas de luz —, e por um prédio em formato circular que abrigará todo esse complexo. Fontes de luz síncrotron como o Sírius são equipamentos de grande porte que produzem uma luz de amplo espectro (infravermelho, ultravioleta e raios X) e que permitem o estudo da matéria em suas mais variadas formas. É física pura, sabemos, mas de uma maneira muito simplificada dá para dizer que o Sirius é um um enorme microscópio com luz própria que permite ver muito mais do que conseguimos em um equipamento tradicional que cabe em cima de uma mesa, uma vez ajuda o cientista a ver a matéria numa escala atômica.
Tudo começa no Canhão de Elétrons, onde um feixe de elétrons é emitido a partir de um cátodo e começa a ser acelerado. Em seguida, ele é inserido no Linac, um acelerador linear, no qual o feixe de elétrons começa a ganhar energia ao ser acelerado em uma velocidade próxima da luz. Do Linac seguimos para o Booster, acelerador circular que aumenta a energia do feixe. É dentro dele que os campos magnéticos dos ímãs são incrementados de forma sincronizada enquanto interagem com um cavidade de radiofrequência que lhes fornece energia a cada volta. Chegando ao Anel de Armazenamento, o feixe de elétrons é mantido em órbitas estáveis com ajuda de ímãs. É aqui que eles passam por dipolos, wigglers e onduladores que vão curvar a trajetória dos elétrons, forçando a produção da luz síncrotron. Produzida a luz síncrotron, o feixe é conduzido para estações experimentais onde será direcionado até as amostras do material a ser analisado por meio de técnicas como espectroscopia do infravermelho ao raio X, espalhamento de raios X, cristalografia, tomografia e outras.
A construção desse equipamento (R$ 1,3 bilhões do governo federal) para estudar a matéria pode soar como algo exagerado aos ouvidos de leigos, mas a questão é que o Sirius será a ferramenta experimental com o maior número de aplicações e de maior impacto do Brasil. Cientistas que buscam soluções para problemas nas áreas de energia, saúde, alimentação e meio ambiente precisam fazer análises em uma escala de átomos e moléculas que só é possível com esse tipo de equipamento. Materiais mais leves e resistentes, melhores fármacos, equipamentos de iluminação mais eficientes e econômicos, fontes de energia renováveis e instrumentos menos poluentes: tudo nasce do estudo da matéria e por isso a luz síncrotron é essencial.
Do UVX ao Sírius
A escolha do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron como casa desse novo e poderoso equipamento não foi por acaso. O LNLS, como também é chamado, foi berço do primeiro acelerador de elétrons do Brasil e da América Latina, o UVX, uma máquina de segunda geração, operado pelo laboratório desde 1997. Chefe da divisão de engenharia do LNSL e responsável técnico pelos aceleradores do Sirius, Ricardo Rodrigues deixa claro que sem a experiência e o subsequente sucesso do UVX seria impensável construir um equipamento desse porte no Brasil hoje. “O UVX mudou inclusive o patamar de investimento do governo na ciência”, comenta. Segundo ele, na época em que o UVX começou a ser construído, em 1987, ficando pronto dez anos depois, em 1997, a indústria brasileira não era suficientemente desenvolvida para ajudar na sua construção, não existiam usuários capazes de usufruir do equipamento e nem mesmo a comunidade científica ligada à Física era a favor do projeto. Porém, já naquela época se sabia que para elevar o patamar das pesquisas científicas feitas no Brasil era preciso investir em ferramentas de alta qualidade e o UVX era uma delas.
Agora, com o Sirius, o objetivo é aproveitar todo esse terreno que o UVX preparou e construir um equipamento que não só terá mais usuários, pois será o mais avançado do mundo durante alguns anos (até que outros centros atualizem seus aceleradores), mas também ajudar a indústria brasileira que já se desenvolveu bastante a ir mais além. E, é claro, dar os cientistas brasileiros o melhor equipamento para que eles façam suas pesquisas no Brasil.
Diferente de outros aceleradores em que o objetivo é entender a origem do universo por meio da Física Nuclear, o Sirius tem como objetivo estudar a matéria e com isso impactar diretamente a sociedade. Rodrigues diz que é difícil imaginar tudo que o equipamento pode fazer pelo o Brasil, e contesta até mesmo aqueles que só vislumbra um prêmio Nobel. “Ganhar um prêmio Nobel é como ganhar um medalha, é um reconhecimento, uma coroação, mas o essencial é processo para chegar ali, o avanço conquistado, é ter o esforço premiado. O importante é usar a tecnologia para ajudar as pessoas a viverem melhor”, ressalta.