Publicado originalmente em G1 em 14 de junho de 2024
Batizado de Orion, laboratório de biossegurança máxima (NB4) será único no mundo, uma vez que será integrado ao Sirius, acelerador de partículas no CNPEM, em Campinas (SP)
Por Fernando Evans, g1 Campinas e Região
A ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Luciana Santos, afirmou nesta sexta-feira (14) que o Orion, laboratório de biossegurança máxima (NB4) de R$ 1 bilhão que está sendo construído no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP), dará mais autonomia tecnológica para que o país combata futuras pandemias.
“Isso vai dar uma resposta ao próprio complexo industrial de saúde e salvar vidas, na medida em que a gente vai ter a capacidade de ter mais autonomia tecnológica e ajudar a prevenir os impactos que podem advir dessas mudanças que estão aí, demonstrando que elas podem acontecer e que a gente tem que garantir que a ciência responda”.
Depois do almoço, Luciana Santos participou da posse de Juliana Daguano na diretoria do Centro de Tecnologia da Informação (CTI) Renato Archer. Juliana é a primeira diretora da história do CTI.
No CTI, a ministra visitou as obras do novo parque tecnológico, previsto para ser inaugurado em setembro de 2024, e o Laboratório de Qualificação de Produtos Eletrônicos, onde ocorre o aprimoramento do hardware de equipamentos diversos, entre eles, a urna eletrônica.
A minsitra também visitou outras instalações do CTI, e teve contato com tecnologias em desenvolvimento nas áreas de impressão 3D e robótica, entre outros.
“O CTI Renato Archer é uma das nossas vinculadas mais tecnológicas. Daqui saem métodos e processos que têm possibilidade de atender demandas variadas no cenário socioeconômico, em temas como indústria 4.0, saúde avançada, tecnologias habilitadoras, está completamente alinhado àquilo que estamos pautando como prioridade”, destacou a ministra.
Segundo Juliana Daguano, o avanço em Tecnologia da Informação (TI) norteia o CTI, que atualmente tem duas grandes áreas estratégicas em desenvolvimento.
“Uma de semicondutores e processos para desenvolvimento de semicondutores, e outra para aplicação de TI, como robótica e inteligência artificial”, explica.
A ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, visita laboratórios do CTI Renato Archer, em Campinas (SP), na companhia da diretora Juliana Daguano — Foto: Fernando Evans/g1
Como será o Orion?
A estrutura permitirá o enfrentamento de futuras pandemias, com estudos de patógenos capazes de causar doenças graves, e terá uma característica única no mundo: é a primeira vez que um NB4 estará conectado a uma fonte de luz síncrotron, o Sirius. Conheça, abaixo, detalhes do projeto.
🧪 O complexo laboratorial de máxima contenção biológica representa um avanço para o Brasil, que permitirá pesquisas com patógenos capazes de causar doenças graves e com alto grau de transmissibilidade (das chamadas classes 3 e 4) – estrutura essa que não existe até hoje em toda a América Latina.
💉Possuir um laboratório de biossegurança máxima (NB4) oferece condições ao país de monitorar, isolar e pesquisar os agentes biológicos para desenvolver métodos de diagnóstico, vacinas e tratamentos.
🧫No caso do Brasil, mais do que armazenar e manipular essas amostras biológicas, o laboratório de biossegurança máxima terá acesso exclusivo a três linhas de luz (estações de pesquisa) do Sirius, o que não existe em nenhum outro lugar do mundo.
🌟 É por conta dessa conexão com o Sirius que vem o nome do projeto, Orion, em homenagem à constelação que possui três estrelas apontadas para a estrela que batizou o acelerador de partículas brasileiro.
👩🔬 O projeto prevê a capacitação de cientistas brasileiros para lidar com agentes infecciosos desses tipos. Essa formação já integra o custo previsto de R$ 1 bilhão.
🏗 O complexo laboratorial terá cerca de 20 mil metros quadrados, e sua construção está prevista para ficar pronta até 2026. Após essa etapa, o Orion passará pelo chamado comissionamento técnico e científico, e também por certificações internacionais de segurança, para que possa entrar em operação regular.
O Orion será único no mundo, uma vez que o complexo laboratorial de máxima contenção biológica estará conectado ao Sirius, fonte de luz síncrotron de 4ª geração — Foto: CNPEM/Divulgação
Vírus circulantes na mira
De acordo com o CNPEM, existem cerca de 60 laboratórios de máxima contenção no mundo, com estrutura e certificados para manipular amostras biológicas classificados como “classe 4” – nenhum deles na América do Sul, Central ou Caribe.
Pesquisas mais aprofundadas sobre a doença não são realizadas hoje em solo brasileiro por falta de infraestrutura adequada. Segundo Antônio José Roque da Silva, diretor-geral do CNPEM, a doença teve recentes notificações.
😷 Veja exemplos de outros vírus que poderão ser manipulados no Orion e que são circulantes na América Latina:
- Junín: causador da febre hemorrágica argentina
- Guanarito: causador da febre hemorrágica venezuelana
- Machupo: causador da febre hemorrágica boliviana
No mundo, estruturas como essa são as responsáveis por análises e estudos de vírus como o Ebola, por exemplo, que são mais perigosos que o Sars-Cov-2, causador da Covid-19.
E a própria Covid-19 serve de alerta sobre a necessidade de monitoramento de agentes conhecidos, em constante mutação, e novas ameaças – crescimento populacional e desmatamento, por exemplo, são apontados como fatores de desequilíbrio em áreas que podem ser reservatórios naturais de doenças ainda desconhecidas.
“A pandemia recolocou no centro do debate a importância do domínio nacional de uma base produtiva em saúde, bem como o papel do Estado na coordenação de agentes e investimentos no enfrentamento da crise sanitária. Nesse contexto, a implantação do laboratório de biossegurança nível 4 é estratégica para o país. E a conexão entre o NB4 e a fonte de luz síncrotron abrirá grandes oportunidades de pesquisa e desenvolvimento na área de patógenos, posicionando o Brasil como liderança global”, afirmou a ministra Luciana Santos.
Por que o Orion será único no mundo?
De acordo com Antonio José Roque da Silva, diretor-geral do CNPEM, além de instalações laboratoriais em NB3 e NB4 e das estações de pesquisa com técnicas de luz síncrotron, junto ao Sirius, o projeto deve ainda reunir laboratórios de pesquisa básica, técnicas analíticas e competências avançadas para imagens biológicas, como microscopias eletrônicas e criomicroscopia.
“Todas essas competências científicas reunidas em um único complexo é algo que o diferencia de toda infraestrutura disponível no Brasil e no mundo”, destaca.
Antônio José Roque da Silva, diretor-geral do CNPEM — Foto: Fernando Evans/G1
Sirius, laboratório de luz síncrotron de 4ª geração, reforça a ciência no enfrentamento do novo coronavírus — Foto: Nelson Kon
Sirius, fase 2
Ele foi projetado para abrigar até 38 linhas de luz (estações de pesquisa), sendo 14 delas previstas na primeira fase. Com o novo PAC, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) vai destinar mais R$ 800 milhões para avançar no projeto, com a construção de mais 10 novas linhas.
Junto as novas estações previstas, outras três serão construídas e conectadas ao complexo Orion (dentro do orçamento do laboratório). As linhas no Sirius são batizadas com nomes inspirados na fauna e flora brasileira, e essas serão a Hibisco, Timbó e Sibipiruna.
As três linhas, segundo o diretor do CNPEM, devem ser entregues justamente com toda a estrutura voltada para pesquisa básica, técnicas analíticas e competências de bioimagens previstas para o Orion.
“Essas estações de pesquisa permitirão extrair informações estruturais quantitativas a respeito dos sistemas infectados com patógenos de classe 3 e 4, desde o nível subcelular até o nível de organismo. Com isso, geraremos imagens 3D que permitirão, por exemplo, o estudo celular em escala nanométrica, passando pela dinâmica de inflamação nos tecidos e danos aos órgãos, até o acompanhamento do processo de infecção no organismo. Juntamente com as outras técnicas avançadas que serão integradas no Orion, teremos condições para que patógenos, células, tecidos e organismos sejam pesquisados de forma segura, o que tornará possível a compreensão dos fenômenos biológicos relacionados ao desenvolvimento das doenças e guiará o desenvolvimento de futuros métodos de diagnóstico, vacinas e tratamentos”, detalha Silva.
❓ Como funciona o Sirius? Para observar as estruturas, os cientistas aceleram os elétrons quase na velocidade da luz, fazendo com que percorram o túnel de 500 metros de comprimento 600 mil vezes por segundo. Depois, os elétrons são desviados para uma das estações de pesquisa, ou linhas de luz, para os experimentos.
🧲 Esse desvio é realizado com a ajuda de ímãs superpotentes, e eles são responsáveis por gerar a luz síncrotron. Apesar de extremamente brilhante, ela é invisível a olho nu. Segundo os cientistas, o feixe é 30 vezes mais fino que o diâmetro de um fio de cabelo.