Quem nunca ouviu falar nos transgênicos ou nos organismos geneticamente modificados? A biotecnologia é figura fundamental por trás dessas transformações na área da agroindústria. Hoje, em laboratório, os biotecnologistas conseguem controlar a patogenicidade da bactéria inutilizando ou silenciando o gene que causa esse problema. Os transgênicos recebem transferência ou sofrem alterações no DNA. O milho BT, por exemplo, recebe na fase adulta o gene que vem de um bacilo e começa a produzir proteína gerada pelo agente. A modificação é mortal para a lagarta que come a folha da planta.
Mas as aplicações da biotecnologia vão além. “Tenho quatro alunos que estão construindo uma impressora 3D. Hoje, com impressora 3D você consegue construir tecidos e órgãos usando células-tronco. Tem pesquisadores recompondo tecidos como orelhas, por exemplo”, afirma Palmieri. A aplicação engenhosa associa computação e tecnologia da informação com a biotecnologia.
Na indústria, o biotecnologista também consegue desenvolver desde vacinas, anticorpos e outras moléculas de interesse farmacêutico, até aumentar a produção de biocombustíveis criando micro-organismos capazes de degradar a sobra da cana-de-açúcar e que era inutilizada. Dados de um mapeamento feito em 2011 pela BRBiotec dão conta de que 40% das empresas de biotecnologia estão no Estado de São Paulo, e o mesmo percentual atua na área de saúde.
Nuances
A grade curricular e o nome do curso de biotecnologia mudam de acordo com as universidades. Nas três mais conceituadas do Estado, ele assume as formas de bacharelado em biotecnologia, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Engenharia Biotecnológica, na Universidade Estadual Paulista (Unesp), e quem deseja cursar na Universidade de São Paulo (USP) opta pelo bacharelado em ciências físicas e biomoleculares, química com atribuição em biotecnologia ou química com atribuição em química tecnológica. A procura pela área e a demanda do mercado é tão grande que a Unesp pretende abrir nos próximos dois anos dois novos cursos: engenharia de bioprocessos e de biotecnologia.
O coordenador do curso de bacharelado em biotecnologia do campus de Araras da UFSCar, Reinaldo Bastos, explica que a biotecnologia sai como bacharelado e tem duração de quatro anos; na engenharia são cinco. “Apesar de todos esses cursos serem na área de biotecnologia, eles têm algumas diferenças. Exemplo: se é criado junto ao curso de engenharia química, vai ter esse perfil. Se a origem é biologia vai puxar mais para genética; a engenharia vai explorar mais as exatas.” A carga curricular de todos eles é rica em exatas, química, biologia e o gosto pela pesquisa é fundamental. “É um curso e uma profissão que envolvem muita pesquisa. Nossos egressos vão para grandes centros e trabalham muito com pesquisa agrícola, industrial, animal, vegetal”, ressalta Bastos.
A opção da estudante de cursinho Tainá Yumi Patriani, 17 anos, está clara. Ela conta que decidiu cursar biotecnologia por gostar de biologia e química. A parte de cálculo ela diz que é suportável. Mas a escolha da estudante também foi pautada por se tratar de uma área em plena expansão. Ela vai prestar vestibular na Unesp e na UFSCar. Na USP ela vai prestar biologia e pretende se especializar na área de genética, e na Unicamp vai prestar engenharia de alimentos. “Demorei dois anos para me decidir e tinha que escolher o certo”, afirma.
Intercâmbio é boa opção para adquirir bagagem
Movidos pelo interesse de se aprofundar no universo da biotecnologia, os estudantes Bruno Cazari, de 23 anos, e Renan Kimura, 22 anos, — ambos do 5 ano de Engenharia Biotecnológica da Unesp de Assis — foram para fora do País e trouxeram do intercâmbio uma bagagem extra para iniciarem a carreira. Cazari participou do programa Ciência sem Fronteiras na Espanha.
“Cursei biotecnologia mesmo, porque não tinha a parte de engenharia. Percebi que o Brasil está avançando, mas ainda precisa de um pouco mais de investimento na área de pesquisa”, afirmou o estudante, que deseja atuar na área farmacêutica e de pesquisa com células tronco. Kimura fez intercâmbio no Instituto Nacional de Ciências Aplicadas da França. “Tive muito contato com as outras áreas da engenharia e a grade é um pouco diferente da nossa. Eles privilegiam muito gestão, administração e economia”, conta.
LNBio, em Campinas, é referência na América Latina
Laboratório ligado ao CNPEM é aberto para receber pesquisadores e tem tecnologia para qualquer trabalho na área
Campinas tem um dos mais importantes centros de pesquisa e aperfeiçoamento na área de biotecnologia do País. O Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), ligado ao Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), é referência não apenas na cidade como na América Latina.
Além de pesquisadores capacitados e de equipamentos de última geração, capazes de fazer biotecnologia de ponta, o laboratório é aberto e recebe profissionais do mundo inteiro. Nos últimos três anos, 1.927 pesquisas de usuários externos foram realizadas nos equipamentos do Laboratório. “O que tem de mais avançado do que se está fazendo no mundo o nosso laboratório tem condições de fazer”, afirma a pesquisadora Andrea Balan Fernandes.
O laboratório tem quatro grandes áreas de estudo, voltadas para pesquisa básica, mas com a proposta de chegar sempre a um produto final. Uma delas é a biologia do câncer, que estuda as várias proteínas associadas ao desenvolvimento ou ativação de células proliferativas, com foco na descoberta de novas intervenções terapêuticas.
O laboratório estuda também as doenças negligenciadas, como tuberculose, leishmaniose e doença de Chagas.
Além disso, estuda a biologia do sistema cardiovascular e a interação entre planta e patógeno.
“O objetivo é sempre chegar a algo que possa ser aplicado: o desenvolvimento de uma droga para controlar a doença, de um bloqueador da interação entre o patógeno e o hospedeiro”, explica.
Formada em biologia e com pós-graduação, doutorado e pós-doutorados na área de biotecnologia, Andrea tem uma atuação extensa na área.
Ela já trabalhou com o melhoramento de linhagem de leveduras para produzir cerveja de melhor qualidade. Atualmente, coordena um grupo de alunos de doutorado e pós-doutorado no LNBio e faz diversas pesquisas. Uma delas é com um grupo de proteínas transportadoras da Mycobacterium tuberculosis. “A gente descobriu que as drogas usadas no tratamento muitas vezes não fazem efeito porque a bactéria tem como se fosse uma bomba de extrusão. Reconhece que a medicação não faz parte do patógeno e manda para fora, causando resistência a antibióticos e drogas.” A ideia é desenvolver um sistema para bloquear o transporte da droga para fora. (IM/AAN)
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