Portal ABDI, junho 2016
Profissionais que são referências mundiais em métodos alternativos ao uso de animais em pesquisas participaram entre os dias 22 e 24 de junho, em Brasília, de treinamento realizado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A proposta foi capacitar servidores da Anvisa, técnicos de laboratórios e da indústria de cosméticos, fármacos e medicamentos, defensivos agrícolas e saneantes sobre os novos conceitos e boas práticas que já são utilizadas, especialmente na Europa, englobando os 17 novos métodos alternativos reconhecidos pelo Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea).
O presidente da ABDI, Luiz Augusto Ferreira, conversou com os participantes ao final do evento e disse que a Agência atuará para incentivar o desenvolvimento de startups em áreas com alta intensidade tecnológica. “Temos grande interesse em engajar empresas de nanotecnologia e biotecnologia para que alcancem maior competitividade no mercado”, afirmou. A ABDI é a instituição que representa a indústria na Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama), que é constituída pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz) e Laboratório Nacional de Biociências (LNBio/CNPEM).
O assessor da Diretoria da Anvisa, Joel Majerowicz, elogiou a parceria da ABDI e Anvisa para realização do evento e destacou a relevância do assunto, o interesse e a participação do público. “Foi um curso de excelência que contribuiu de forma significativa para o nivelamento de conceitos acerca dos métodos alternativos”, apontou. Ele disse que a Anvisa assumiu o compromisso com a disseminação do tema e que ainda há necessidade de incentivos financeiros para adoção das melhores práticas.
Regulação– Para a presidente executiva da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (Abipla), Maria Eugenia Saldanha, o evento foi extremamente importante para disseminar o conhecimento e aproximar membros da academia, governo, indústria e organizações não-governamentais (ONGs) para discutir a evolução e os obstáculos aos métodos alternativos no país. “O Brasil tem potencial, demanda e ótimos cientistas, mas precisará também de investimentos do governo, das indústrias e ajustes em questões regulatórias”, observou.
As mudanças na legislação também são motivo de preocupação para o professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), Marco Antônio Stephano. “Percebemos que existe vontade das empresas em não usar mais animais nas pesquisas, mas essa transformação exigirá não apenas mudanças regulatórias, mas também na Constituição Federal”, afirmou. Segundo ele, o Brasil está se preparando e criando caminhos para adoção dos métodos alternativos, mas ainda depende de matérias-primas e insumos importados. “É preciso baixar os custos desses materiais, ter isenção de impostos e facilitar a entrada de equipamentos e insumos”, avaliou.
A especialista da ABDI Cleila Pimenta Bósio explica que a maioria dos 17 métodos alternativos reconhecidos pelo Concea usam técnicas como cultura de células humanas in vitro. “É uma regulação que força a inovação”, evidencia. Segundo ela, a disseminação dos métodos alternativos pretende oferecer outras opções viáveis para a indústria, minimizando o uso de animais e se adequando à nova legislação. Os métodos alternativos podem substituir o uso de animais em estudos e pesquisas sobre irritações de pele, para análise de irritação ocular, para medicamentos ou para agrotóxicos.
Referência brasileira– Entre os grandes pesquisadores do tema que participaram do treinamento está a brasileira Chantra Eskes, radicada na Suíça e especialista em Toxicologia in vitro. Ela fará parte do projeto Rede Diáspora Brasil na Europa, realizado pela ABDI desde 2013, e que constituiu uma rede formada por mais de 700 brasileiros com atuação reconhecida no exterior em áreas como ciência, tecnologia, inovação e empreendedorismo. O objetivo do projeto é aproximar esses profissionais de organizações brasileiras com interesse no desenvolvimento conjunto de projetos e negócios tecnológicos, parcerias e cooperação em pesquisa.
Para Chantra, que há mais de 10 anos acompanha os avanços na área de Toxicologia, é preciso facilitar a aplicação dos métodos alternativos para uso nos laboratórios brasileiros, que ainda enfrentam dificuldades para adquirir materiais necessários paras as técnicas in vitro. “Fico muito feliz de ver que há vontade e interesse do país em disseminar e aplicar essas práticas. Para isso, as parcerias entre governo, empresas e instituições de pesquisa são essenciais. O que espero é que a pesquisa de métodos alternativos avance de forma mais rápida”, comentou a pesquisadora.
O professor Mathieu Vinken, do Departamento de Toxicologia In Vitro e Dermato-cosmetologia da Universidade de Vrije, de Bruxelas, elogiou o alto nível científico dos participantes do treinamento e as interações provocadas pelos exercícios práticos. “É a primeira experiência que temos fora da Europa em disseminar essas práticas de toxicologia in vitro”, destacou. Para ele, o Brasil tem potencial não só para implementar o conhecimento científico, mas para disseminar o conteúdo para a América Latina.
A coordenadora científica do Departamento de Métodos e Modelos Biológicos Preditivos da L´Oreal, Nathalie Alepee, também avaliou que o Brasil está preparado para implementar os métodos alternativos e, para isso, é fundamental, em sua opinião, a parceria entre indústria, empresas e governo.