Tendências/Debates Folha de S. Paulo em 04/08/2011
Em cerimônia bastante concorrida, no dia 11 de julho, a presidente Dilma Rousseff entregou a cinco pesquisadores brasileiros o Prêmio Anísio Teixeira. A solenidade faz parte das comemorações dos 60 anos da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
O prêmio, segundo o site da instituição, que a cada cinco anos escolhe os agraciados, “é uma homenagem ao educador Anísio Teixeira, intelectual baiano que difundiu o papel transformador da educação e da escola para a construção de sociedade moderna e democrática”.
Todos os escolhidos, a saber, Álvaro Toubes Prata (engenharia), Fernando Galembeck (química), João Fernando Gomes de Oliveira (engenharia), Luiz Bevilacqua (engenharia) e Nelson Maculan Filho (engenharia) são cientistas de grande destaque em suas áreas de atuação e nas comunidades científicas nacional e internacional.
Chama a atenção, no entanto, o fato de nenhuma mulher ter sido escolhida para receber condecoração tão importante, rara e, por isso mesmo, de grande valor simbólico.
É evidente que a premiação aludida é apenas a forma como, neste momento, tais desigualdades vêm a público; ela é, por assim dizer, a ponta do iceberg.
Afinal, não é do desconhecimento dos cientistas de diversas áreas que as mulheres estão longe de alcançar em postos de comando de agências de fomento, em comitês assessores e nas reitorias de universidades a mesma presença que têm na produção científica nacional.
Ou seja, mesmo que uma mulher tenha chegado ao mais alto posto da República, é desolador ver que mesmo ela tem que se curvar às formas desiguais de como o poder está distribuído no interior da comunidade acadêmica.
A esse respeito, podemos estar enganados, mas, assistindo à cerimônia pela TV, foi visível a surpresa da presidente quando viu que só aqueles cinco seriam os agraciados! Será que ela esperava que houvesse mulheres entre eles? Talvez.
Porém, apesar de ser uma homenagem a Anísio Teixeira -intelectual que se notabilizou como defensor da importância da escola básica para o desenvolvimento do país- e de a importância da escola básica ter tido destaque na cerimônia, inclusive porque a Capes tem, agora, importantes responsabilidades com esse nível da educação, soa muito estranho que nenhum pesquisador ou pesquisadora tenha sido escolhido por sua contribuição à educação pública, oferecida à imensa maioria da população.
Note-se, do mesmo modo, que nenhum pesquisador da área de humanidades foi agraciado.
Mais uma vez, a opção foi por privilegiar aqueles que, de forma reconhecidamente competente, diga-se de passagem, contribuíram com o ensino superior e com a pós-graduação. Isso não é pouco, mas, convenhamos, não faz justiça a todo o legado anisiano.
Considerando o valor simbólico do prêmio como um reconhecimento não apenas ao agraciado mas também à sua área de atuação e contribuição, o esquecimento dos pesquisadores que, por meio de suas pesquisas em diversas áreas do conhecimento, contribuem para a melhoria da escola básica soa estranho, sobretudo no momento em que a Capes se esforça para estruturar ações estratégicas na área da educação pública.
Luciano Mendes de Faria Filho é professor associado da UFMG e coordenador do projeto Pensar a Educação Pensar o Brasil – 1822/2022. Foi coordenador do Comitê de Assessoramento de Educação do CNPq;
Eliane Marta Santos Teixeira Lopes, professora titular aposentada da UFMG, é pesquisadora de história da educação e relações de gênero.