Por O Globo – Blogs em 11/09/2021
O excesso de tela na pandemia tem deixado a vista cansada, mas o alívio para os problemas oculares pode vir da biodiversidade brasileira.
Uma nova patente registrada pela farmacêutica AbbVie nos EUA prevê o uso da pilocarpina, substância extraída do Jaborandi, arbusto de origem brasileira encontrado no Norte e Nordeste, para tratar presbiopia. Doença popularmente conhecida como vista cansada, a presbiopia atinge quase 2 bilhões de pessoas em todo o mundo.
A nova patente deve dar uma sobrevida para a pilocarpina, que há décadas é usada no tratamento de glaucoma e xerostomia (boca seca), mas vinha perdendo mercado para concorrentes sintéticos e outras formulações.
Os primeiros medicamentos contendo pilocarpina para tratamento de vista cansada da farmacêutica americana AbbVie devem chegar às farmácias nos próximos meses – e o desenvolvimento desse novo mercado tem potencial para dobrar a produção da Centroflora, empresa fabricante de IFAs (Ingrediente Farmacêutico Ativo) verdes, extratos botânicos e óleos essenciais para as indústrias de fitomedicamentos e cosméticos.
A Centroflora detém dois terços da produção global de pilocarpina de rota natural – o outro terço é produzido pela também brasileira Sourcetech – exportando 96% da produção para 60 países.
– A nova patente pode impactar mais de 1 mil famílias que vivem da cadeia do Jaborandi no Piauí, Maranhão e Pará, dentro de um projeto de colheita ética – diz Peter Andersen, CEO da Centroflora.
A Centroflora foi fundada há 60 anos tendo como principal produto o Chophytol, um extrato de alcachofra. Nos anos 80, o pai de Peter, que era cônsul da Dinamarca em São Paulo, resolveu se fixar no país e adquiriu o negócio.
Desde os anos 90, os Andersens investem em um programa para fomentar a agricultura familiar, o BrazBio, que faz a gestão e dá suporte a 4.200 famílias que cultivam plantas medicinais com manejo ético para produção de extratos.
O crescente interesse pela bioeconomia e pelas práticas ESG tem ampliado a atratividade dos IFAs verdes, que têm apelo ambiental e também social, com uma colheita certificada e rastreável.
A empresa deve faturar R$ 110 milhões este ano e está concluindo investimentos de quase R$ 60 milhões na ampliação de capacidade produtiva da sua planta em Botucatu (SP) e em um centro de pesquisa e desenvolvimento, o Centroinova. Instalado dentro do Technopark, em Campinas (SP), o centro tem uma linha de inovação radical e projetos em parceria com o Sirius, o acelerador de partículas. A ideia é desenvolver novas IFAs de rota natural aproveitando a biodiversidade brasileira. As IFAs poderão ser usadas tanto pelas farmacêuticas tradicionais quanto para a produção de fitomedicamentos e fitoterápicos.
– Queremos que as empresas brasileiras olhem para a Centroflora como um parceiro para o desenvolvimento de fitomedicamentos, estimulando a bioeconomia e preservando as florestas – diz Peter.