Trabalho sobre a linha de luz Imbuia foi capa de revista científica e impacta ampla comunidade de pesquisadores do Brasil
Um artigo publicado por pesquisadores do CNPEM foi capa do Journal of Synchrotron Radiation (JSR) e detalha o projeto e funcionamento da linha de luz Imbuia do Sirius, dedicada à micro e nanoespectroscopia de infravermelho (IR). O trabalho pioneiro abre portas para que outras instituições de pesquisa no mundo construam novas linhas de luz de infravermelho em fontes de luz síncrotron de quarta geração.
A importância da espectroscopia no infravermelho para a ciência
A espectroscopia no infravermelho (IR) é capaz de acessar a composição molecular de diversos tipos de materiais, de células do nosso corpo aos microchips presentes em eletrônicos. Para fazer isso, estes materiais são introduzidos em um espectrômetro no qual a amostra é exposta à radiação no infravermelho e, assim, mede-se a absorção dessa radiação em diferentes comprimentos de onda ou frequências da luz.
Como as moléculas têm movimentos vibracionais específicos que correspondem a diferentes energias no espectro infravermelho, a absorção em determinadas frequências permite identificar quais grupos moleculares funcionais estão presentes na amostra, seja em misturas complexas ou em compostos puros. Neste arranjo, a composição química da amostra é revelada na leitura deste espectro de absorção.
Por ser uma resposta vibracional natural da matéria, não há necessidade de uso de marcadores químicos ou marcação fluorescente para análise de materiais biológicos, o que permite uma análise não invasiva, preservando a integridade da amostra e evitando a introdução de artefatos que poderiam interferir nos resultados. Além disso, esta vantagem simplifica o processo experimental, reduz custos e possibilita análise em tempo real de amostras complexas, como tecidos e células.
A espectroscopia no infravermelho tem uma ampla gama de aplicações na análise de polímeros, permitindo a caracterização precisa de sua composição química e estrutura molecular. Isso é crucial para o estudo ambientais relacionados a microplásticos, por exemplo, tornando possível identificar e quantificar pequenas partículas plásticas em amostras ambientais e contribuindo para um entendimento mais completo da poluição e impactos causados por estes materiais. Além disso, a técnica também pode ser usada em campos como bioquímica, farmacologia, biomateriais, materiais energéticos e materiais 2D.
Fontes de luz síncrotron de quarta geração como o Sirius representam um grande avanço para várias áreas de pesquisa. Suas densas redes magnéticas geram feixes de raios X com alta coerência e brilho, possibilitando experimentos mais rápidos, com maior resolução espacial e temporal.
No entanto, as densas redes magnéticas dessas máquinas criam desafios para a extração de comprimentos de onda mais longos e menos energéticos, como os do ultravioleta e do infravermelho, que são fundamentais para muitas áreas científicas.
Imbuia: a primeira linha de luz infravermelha em uma máquina de 4ª geração
Em março de 2022, a linha de luz Imbuia recebeu o seu primeiro feixe de luz síncrotron após ser conectada aos aceleradores de elétrons do Sirius, se tornando a primeira infraestrutura de pesquisa do mundo a se beneficiar de radiação infravermelha gerada a partir de um acelerador síncrotron de quarta geração.
“A extração de radiação infravermelha (IR) em síncrotrons de 4ª geração traz desafios específicos e bastante complexos. A configuração dos magnetos nesses anéis foi otimizada principalmente para raios X de alta energia, o que torna a captura eficiente da radiação no infravermelho mais difícil.”, comenta Raul Freitas, coordenador da linha de luz Imbuia no Sirius.
Os magnetos em redes MBA (Multi-Bend Achromat) são posicionados muito próximos uns dos outros para reduzir a emitância e aumentar o brilho da fonte, o que limita o espaço disponível para a extração de radiação infravermelha, que requer componentes ópticos adicionais para guiar a luz IR do anel até a linha de luz.
Em fontes de luz síncrotron de 4ª geração, como o Sirius, a configuração dos magnetos é projetada para fornecer raios X de alta energia, o que significa que a energia crítica geralmente é elevada. No entanto, a radiação IR está no extremo oposto do espectro, com comprimentos de onda muito maiores e, portanto, associada a energias muito menores.
Para resolver este desafio, a linha de luz Imbuia tem como fonte um dipolo de baixo campo no anel de armazenamento do Sirius, que gera um campo magnético com pico de intensidade de 0,56 T, o que reduz significativamente a energia crítica e permite uma extração mais eficiente de luz com comprimentos de onda mais longos.
“O primeiro elemento óptico da Imbuia é um espelho plano revestido de ouro e montado verticalmente, localizado na frente da janela de extração da radiação síncrotron. Ele reflete a porção da radiação de baixa energia enquanto absorve a parte de alta energia.”, comenta Raul.
Neste ponto do anel, a radiação síncrotron gera uma carga térmica de cerca de 140 W, portanto, este espelho precisa ser resfriado para evitar deformações térmicas que possam comprometer a qualidade óptica. Um sistema de resfriamento circula água a cerca de 21°C, o que mantém a superfície do espelho em temperaturas controladas.
Outros elementos ópticos fazem parte da linha de luz Imbuia, como janelas ópticas, espelhos planos, espelhos parabólicos e um espelho elíptico. Tudo isso, em conjunto com as características da radiação síncrotron gerada pelo Sirius, garante alta estabilidade e baixa distorção do feixe, garantindo uma excelente relação sinal-ruído em experimentos de espectroscopia no infravermelho nas duas estações experimentais da linha.
“A antiga linha de luz IR do UVX, a antiga fonte de luz síncrotron do CNPEM operada pelo LNLS, atendia uma ampla gama de pesquisadores brasileiros, que exploravam uma diversidade de amostras, incluindo materiais 2D, como grafeno, materiais energéticos, comoperovskitas e novas baterias, além da biologia de células isoladas, como neurônios e a entrega de fármacos em membranas celulares. Com a nova linha de luz Imbuia, surgem oportunidades inovadoras para o uso dessas técnicas, combinando a alta estabilidade do feixe de uma fonte de luz síncrotron de 4ª geração com equipamentos de análise avançados.”, destaca Harry Westfahl Jr., diretor do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron.
Conheça mais sobre a linha de luz Imbuia
Sobre o LNLS
O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) atua na pesquisa científica e no desenvolvimento tecnológico envolvendo a luz síncrotron, com foco na operação e exploração do potencial multidisciplinar do Sirius, a mais avançada infraestrutura científica do País. Com dez estações de pesquisa já operacionais e abertas à comunidade científica e industrial, Sirius permite que milhares de pesquisadores de diversas áreas testem hipóteses sobre os mecanismos microscópicos que resultam nas propriedades dos materiais, naturais ou sintéticos, usados em diferentes campos, tais como saúde, meio ambiente, energia e agricultura. O LNLS faz parte do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP), uma Organização Social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Sobre o CNPEM
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) abriga um ambiente científico de fronteira, multiusuário e multidisciplinar, com ações em diferentes frentes do Sistema Nacional de CT&I. Organização Social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o CNPEM é impulsionado por pesquisas que impactam as áreas de saúde, energia, materiais renováveis e sustentabilidade. Responsável pelo Sirius, maior equipamento científico já construído no País, O CNPEM hoje desenvolve o projeto Orion, complexo laboratorial para pesquisas avançadas em patógenos. Equipes altamente especializadas em ciência e engenharia, infraestruturas sofisticadas abertas à comunidade científica, linhas estratégicas de investigação, projetos inovadores com o setor produtivo e formação de pesquisadores e estudantes compõem os pilares da atuação deste centro único no País, capaz de atuar como ponte entre conhecimento e inovação. O CNPEM é responsável pela operação dos Laboratórios Nacionais de Luz Síncrotron (LNLS), Biociências (LNBio), Nanotecnologia (LNNano) e Biorrenováveis (LNBR), e também pela Ilum Escola de Ciência, curso de bacharelado em Ciência e Tecnologia, com apoio do Ministério da Educação (MEC).