G1 em 15 de Agosto
Um estudo que utiliza nanopartículas carregadas com curcumina, substância extraída do açafrão da terra, pretende reduzir os efeitos colaterais no tratamento do câncer de próstata. A pesquisa é desenvolvida no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas (SP), mas conta com a participação também dos laboratórios de Biociências (LNBio) e de Nanotecnologia (LNNano).
A quimioterapia é um dos principais métodos usados para combater o câncer atualmente. Como a doença se caracteriza pela multiplicação descontrolada de células, a maioria das substâncias age interferindo no mecanismo de renovação celular.
Mas, por causa dessa ação, tanto células cancerosas quanto sadias são afetadas, o que gera efeitos colaterais como queda de cabelo e problemas nas unhas dos pacientes.
Redução de danos
Segundo o pesquisador Mateus Borba Cardoso, responsável pelo estudo, o diferencial do projeto desenolvido no LNLS é atingir apenas as células tumorais, o que, consequentemente, reduz os danos ao paciente em tratamento.
“Consegue eliminar praticamente todas as células tumorais enquanto as sadias são pouco afetadas. Não é a cura do câncer, mas um avanço muito significativo. Não é a cura porque é necessário que se façam experimentos in vivo”, explica.
Nanopartículas
A pesquisa começou em 2009, quando Cardoso voltou ao Brasil para trabalhar no LNLS. “Eu queria desenvolver partículas para aplicações biomédicas em geral. Mas, trabalhar com câncer é uma coisa cara […] comecei a trabalhar com bactérias primeiro e depois com câncer. Até 2012 eu fiquei quase que, exclusivamente, em bactérias e depois em diante eu comecei a expandir para células tumorais”, explica.
O estudo consiste em utilizar as nanopartículas, que são aglomerados de átomos, que funcionam como veículos que carregam e entregam o medicamento diretamente nas células doentes.
Na pesquisa feita em Campinas, as nanopartículas, que são de sílica, foram carregadas com curcumina e funcionalizadas com folato. O método foi testado in vitro, em culturas de células cancerosas e saudáveis da próstata.
“Essas nanopartículas têm o diâmetro de um fio de cabelo, o fio tem 50 micrômetros e essas bolinhas têm, em média, 50 nanômetros, mil vezes menor. Dentro dessas bolinhas, a gente conseguiu colocar curcumina. A curcumina é uma molécula que é capaz de matar células tumorais, não só de próstata, mas de mama e outros tipos de cânceres”, revela Cardoso.
Segundo o pesquisador, além do uso das instalações do LNLS, foi necessário utilizar a estrutura de outros laboratórios em alguns experimentos feitos nesta primeira fase de testes. “No LNNano, a gente fez a parte de microscopia, onde a gente tirou foto das partículas. E no LNBio, a gente fez os testes in vitro”, destaca.
Resultados
O estudo verificou que as nanopartículas preparadas com a curcumina e “encapadas” com folato foram eficazes tanto em matar as células cancerosas quanto em não serem tóxicas para as saudáveis.
No entanto, Cardoso explica que apesar de eficaz, a curcumina não é utilizada comercialmente porque era difícil colocá-la em fluidos biológicos. “Optei por usar um fármaco, a curcumina, muito barato e que já foi comprovado sua ação antitumoral e ele só não é utilizado por causa da baixa solubilidade. […] na nanopartícula, como ela é estável em fluidos biológicos, eu consigo colocar uma grande quantidade da curcumina dentro da partícula, eu consigo aumentar a dose da curcumina”, explica.
Mas, segundo o pesquisador, o que justifica essa seletividade não é a curcumina e sim o uso do folato, que é uma espécie de “isca”.
“O folato que está na superfície, porque a célula tumoral tem de 200 a 300 vezes mais detectores de folato que uma célula sadia, ou seja, na superfície da célula, existem coisas que querem folato. A célula tumoral quer muito mais folato do que uma célula sadia […] A curcumina é nosso fármaco antitumoral. O folato é como se fosse uma capinha que tem na nanopartícula”, ressalta.
Futuro
Segundo o pesquisador, foram feitos até agora os testes in vitro, o próximo passo é testar em animais, mas para que isso aconteça é preciso encontrar parceiros.
“Tudo depende muito do aporte financeiro. Os testes em animais são relativamente rápidos, em torno de um ano. Depois, os testes em humanos são um pouco mais demorado, em torno de três ou quatro anos. […] Só que sozinho não consigo avançar, precisa de aporte financeiro, tanto de pessoas envolvidas, que querem trabalhar junto. Então, precisaria de pessoas interessadas para poder conduzir esses testes”, afirma.
Cardoso explica ainda que a ideia a partir deste projeto é chegar num prazo de 15 anos a um tipo de medicina mais personalizada. “Uma vez diagnosticado o câncer de uma pessoa, tentaria ver qual é a droga que funciona para aquele tipo, colocaria a droga dentro da nanopartícula e veria quais são os receptores daquele tipo de tumor e tentaria colocar alguma coisa que liga nesse receptor na superfície da partícula”, finaliza.
Repercussão: Jornal A Gazeta; Agência CTI; Binholocutor