Jornal da Ciência em 09/10/2015
O novo ministro da pasta de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), Celso Pansera, quer manter um canal aberto de diálogo com a comunidade científica e reafirmou o compromisso de dar continuidade a todas as agendas em andamento no Ministério, a fim de “viabilizar um novo ciclo de desenvolvimento, baseado na competitividade do setor produtivo e na sustentabilidade”.
As afirmações de Pansera ocorreram na cerimônia de transmissão de cargos, realizada na tarde desta quinta-feira, 08, na sede do CNPq, em Brasília. Ele sucede na pasta Aldo Rebelo, que agora é o titular do Ministério da Defesa.
“Nossa agenda baseia-se no diálogo com a sociedade, parlamentares, governadores, partidos, movimentos sociais e com quem faz e produz ciência e tecnologia”, disse. “O nosso foco será estimular a ciência básica, a criação de novas tecnologias e processos, inovação e sua incorporação nos processos produtivos formando mais e melhores cientistas”, complementou.
O novo ministro destacou que na véspera havia conversado com a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a biomédica Helena Nader, presente à mesa da cerimônia, e disse que a intenção é ter uma relação transparente e de debates com a comunidade científica, de olho no bem comum.
“Meu grande desafio pessoal será manter a alma aberta, o coração tranquilo e o espírito amigo”, declarou.
Pansera reconheceu o fato de ter assumido o Ministério em um contexto de um esforço “consciente” da presidente Dilma para ampliar a articulação política entre o Executivo e o Legislativo.
“Sou uma pessoa que, por característica pessoal, gosta de conversar e dialogar. Acredito que minha trajetória tem coerência com a missão que agora tenho a honra de assumir no MCTI”, declarou, ao traçar um breve histórico sobre sua trajetória pública e profissional.
Desafios em tempos de crise
Pansera também mencionou os desafios do País para o enfrentamento da crise política e econômica. “O Brasil passa por um grande desafio econômico e político, desafios esses que trazem implicações diretas para área de ciência, tecnologia e inovação”, disse. “Por um lado, isso sinaliza a redução da disponibilidade de recursos em curto prazo. Por outro, cria oportunidades para revisar métodos e processos, e continuar apoiando a pesquisa e o desenvolvimento para aumentar as oportunidades, melhorias e inovação de produtos, processos e tecnologias que incrementem os setores produtivos, levando ao crescimento e desenvolvimento sustentável do País”, refletiu.
Em seu discurso de entrega do cargo a Pansera, Aldo Rebelo prontificou-se a apoiar a transição de seu sucessor, e afirmou estar convicto de que ele “conduzirá e liderará a pasta da Ciência, Tecnologia e Inovação correspondendo às mais elevadas expectativas do governo, da presidente Dilma, da sociedade brasileira, dos pesquisadores, dos cientistas e de toda a comunidade ligada à pesquisa, à ciência e ao esforço de inovação do nosso País”.
Projetos em andamento no MCTI
O ex-ministro aproveitou para falar de seu trabalho à frente da pasta de CT&I. Citou, por exemplo, os esforços para recompor o orçamento da pasta em um ano de forte ajuste fiscal; as medidas para recuperar os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), a destinação de parte do Fundo Social do Pré-Sal, ainda não regulamentada, para ações de ciência, tecnologia e inovação. O ex-ministro explicitou que 50% da partilha ainda faltam ser distribuídos. E destacou a negociação de um empréstimo de US$ 2 bilhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para fomentar atividades do setor nos próximos anos.
Rebelo mencionou, ainda, a inclusão de três obras no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), o projeto Sirius e a mina de urânio das Indústrias Nucleares do Brasil (INB) em Caetité (BA). A intenção, segundo ele, é adicionar outras duas obras, ainda não definidas.
“Eu não concebo ciência, tecnologia e inovação distante de aceleração do crescimento. Como se acelera crescimento sem ciência, sem pesquisa?”, questionou.
Expectativa da comunidade científica
A presidente da SBPC falou com a imprensa após a cerimônia e disse que a expectativa da comunidade cientifica é de que o novo ministro dê continuidade aos projetos em andamento. “Tivemos uma reunião na quarta-feira (07), como ele mesmo mencionou, muito franca e aberta. Reforcei que a ciência e a tecnologia são áreas estruturantes para um país, assim como a educação”, disse.
Helena Nader mencionou ainda que, na conversa que teve com Pansera, ressaltou ser contra o ajuste fiscal nas áreas de CT&I, igualmente na de educação, considerando que essas representam o futuro, e o contingenciamento de recursos nessas áreas estratégicas para o desenvolvimento de qualquer nação aborta qualquer perspectiva futura para um país melhor.
“A sociedade civil não aguenta mais ter de recomeçar. É importante que a prioridade seja dada aos projetos em andamento e nos horizontes já traçados”, contou.
Nesse contexto, reforçou ao ministro a necessidade de executar os projetos estabelecidos no Livro Azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável e a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012-2015.
“Entendemos a troca de ministros, a presidente Dilma tem esse direito, porque foi eleita democraticamente, e nós, como sociedade civil, temos a obrigação de alertar que não dá mais para cada um ter uma grande ideia. É preciso ter um projeto nacional”, disse.
“A 4ª Conferência é um planejamento de 10 anos e, até agora, poucas coisas aconteceram. O novo ministro disse que vai dar segmento aos projetos já acordados com a presidente Dilma e isso nos deu uma certa tranquilidade”, disse.
Nader lembrou, ainda, que a SBPC colaborou com a criação do MCTI e disse que a comunidade científica se coloca a disposição de Pansera em tudo que for preciso para o bem do Brasil.
“Tenho certeza que haverá uma interlocução com o novo ministro e, assim, vamos poder caminhar para ter aquilo que sonhamos: uma ciência e tecnologia fortes que produzam e tragam impacto na inovação”, declarou.
Outras propostas da SBPC e ABC
Com posicionamento semelhante, o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis, que também participou da cerimônia, demonstrou otimismo com o diálogo traçado com o novo ministro. “A expectativa é muito boa, porque as propostas da ABC e SBPC foram bem acolhidas e as ações estão sendo tomadas nessa direção; e este momento pode e deve ser um novo horizonte para ciência, tecnologia e inovação do País”, declarou.
Dentre uma lista significativa de propostas apresentadas a Pansera, Palis citou, por exemplo, a que defende o carimbo de uma parte dos recursos da extração do petróleo da camada pré-sal para CT&I; o descontingenciamento dos recursos dos fundos setoriais; e a abertura de empréstimos internacionais para ações de ciência, tecnologia e inovação.
“Esperamos que o conjunto de ações apresentadas coloque o Brasil em um novo patamar, no caminho de termos 2% do PIB investidos nessa área. Em tempos difíceis, como o atual, a melhor solução é investir em ciência, tecnologia e inovação, assim como já aconteceu em nações mais avançadas”, aconselhou.
O presidente da ABC comentou também que a troca de mais um ministro na pasta de CT&I não preocupa. “Creio que eles (Rebelo e Pansera) encontraram os caminhos. Acho que eles estão se entendendo muito bem e não vejo dificuldade nisso”, finalizou.
Viviane Monteiro/ Jornal da Ciência