Componente antibiótico aprisionado em nanopartículas de sílica mostrou-se eficaz contra bactérias resistentes e multirresistentes

A diferença entre as nanopartículas de sílica “vazias” e aquelas com o antibiótico aprisionado é visível a olho nu: enquanto a sílica pura tem cor branca, a sílica com tetraciclina é amarelada.
A proliferação de bactérias cada vez mais agressivas e resistentes a antibióticos tem sido uma preocupação crescente dos sistemas de saúde em todo o mundo, e já é considerada uma crise global pela Organização Mundial de Saúde (OMS), de acordo com o relatório divulgado pela entidade este ano.
Uma pesquisa desenvolvida no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) reforça a ideia de que a nanotecnologia é uma importante aliada para o desenvolvimento de uma nova geração de antibióticos, capazes de superar a ineficiência dos agentes convencionais e de evitar as limitações no tratamento de doenças.
Coordenado pelo pesquisador Mateus Cardoso (LNLS), o estudo resultou no desenvolvimento de um método de aprisionamento de um componente antibiótico em nanopartículas de sílica. O efeito bactericida desse “nanocomponente” foi comparado ao do antibiótico convencional, não aprisionado, e mostrou-se muito superior no combate a bactérias resistentes ou multirresistentes – ou seja, aquelas imunes a mais de um agente antibiótico.
Nanopartículas
As nanopartículas de sílica usadas no estudo, chamadas MSN (mesoporous silica nanoparticles) têm atraído a atenção de pesquisadores devido à possibilidade de ter seu formato ajustado, somada à capacidade de aprisionar agentes antitumorais, marcadores, proteínas, genes e até mesmo DNA. Combinadas, essas duas características das nanopartículas abrem as portas para o desenvolvimento de sistemas formatados sob medida para a liberação de fármacos nas células.
De acordo com Mateus Cardoso, a análise do tamanho médio das nanoesferas de sílica e da distribuição desses tamanhos nas amostras analisadas foi feita usando a técnica de espalhamento de raios X a baixos ângulos (SAXS), disponível no síncrotron do LNLS. “Essas medições foram úteis para garantir a uniformidade do tamanho das nanopartículas em cerca de 60 nanômetros de diâmetro, para garantir o efeito bactericida que desejávamos. Nanopartículas de tamanhos diferentes têm propriedades bactericidas também diferentes”, explica.

Gráfico mostra a atividade antimicrobiana das nanopartículas de sílica sem antibiótico (SiO2), do antibiótico aprisionado nas nanopartículas (SiO2-TC) e no antibiótico comum, não aprisionado (TC), quando expostos a bactérias susceptíveis (parcela sobrevivente mostrada nas barras azuis), bactérias resistentes (barras vermelhas) e multirresistentes (barras pretas). No caso das bactérias resistentes e multirresistentes, a parcela sobrevivente mostrou-se menor quando elas foram atacadas pelo antibiótico aprisionado em nanopartículas.
Bactericida
Neste estudo, as nanopartículas de sílica foram usadas para o encapsulamento do antibiótico tetraciclina, um agente antimicrobiano de amplo espectro. A eficácia desse nanocomposto foi testada contra a bactéria E. coli, tanto na sua cepa susceptível aos antibióticos convencionais quanto na multirresistente. Seu efeito bactericida foi também comparado com o do antibiótico convencional, não encapsulado. Os resultados foram relatados no artigo “Tailored Silica−Antibiotic Nanoparticles: Overcoming Bacterial Resistance with Low Cytotoxicity” (nanopartículas sílica-antibiótico feitas sob medida: superando a resistência bacteriana com baixa citotoxidade), publicado em junho pela revista Langmuir.
O estudo mostra que a tetraciclina aprisionada nas nanopartículas de sílica foi capaz de evitar a multiplicação das bactérias resistentes, enquanto o antibiótico comum não teve nenhum efeito significativo. Já para as bactérias não resistentes, o efeito do nanocompósito foi comparável ao do antibiótico comum, não aprisionado.
Sem toxidade para as células
Posteriormente, esses nanocompósitos foram expostos a células humanas do tipo HEK293t (células renais de embrião humano), e não mostraram nenhum dano ou efeito tóxico. Este é o primeiro relato de nanocompósitos eficientes no combate a bactérias resistentes e que não são significativamente tóxicos para as células.
A pesquisa, desenvolvida por pesquisadores do LNLS, LNBio (Laboratório Nacional de Biociências), UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e do Instituto de Química da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), teve financiamento da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Assessoria de Comunicação do CNPEM