24/11/2008 – Jornal da Ciência
Laboratório nacional localizado em Campinas planeja desenvolvimento de máquina mais potente.
O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, já iniciou o processo de elaboração do projeto de construção da nova fonte de radiação eletromagnética para o estudo de átomos e moléculas, que será usada por pesquisadores de vários locais do mundo.
Durante três anos os cientistas trabalharão na elaboração do projeto de substituição e atualização da atual máquina, que ainda tem uma vida útil de até 15 anos. O primeiro passo já foi dado com a liberação de R$ 2 milhões para o início dos trabalhos. “Já iremos começar a contratação de engenheiros e físicos para montar a equipe que vai desenvolver o projeto”, conta o diretor geral da Associação Brasileira de Tecnologia de Tecnologia de Luz Síncrotron (ABTLuS) José Antônio Brum.
A elaboração do projeto está orçada em R$ 15 milhões e a expectativa é a de que a construção da máquina comece entre 2011 e 2012. De acordo com Brum, a construção da nova fonte pode demorar cerca de dez anos, mesmo tempo que levou a construção do primeiro equipamento. “Nós faremos uma máquina maior, mas já temos experiência no processo”, explica o físico.
Apesar do projeto ainda não ter sido finalizado, a ABTLuS já tem uma estimativa de que a nova máquina irá custar entre US$ 150 e US$ 200 milhões. A primeira fonte, construída entre 1987 e 1997, custou US$ 70 milhões. Naquela ocasião, 85% dos componentes utilizados na construção da máquina foram nacionais, principalmente com o desenvolvimento de oficinas no próprio laboratório. “Espero que a nova máquina seja feita com uma participação maior da indústria brasileira”, diz o físico.
Durante a elaboração do projeto, explica Brum, a equipe construirá protótipos de componentes para realizar testes com as novas tecnologias. Isso porque a máquina tem que ser planejada para atender à demanda das pesquisas que serão feitas no futuro.
O desafio da equipe de cientistas é preparar hoje um equipamento que seja compatível com as novas tecnologias que virão a aparecer pelos próximos 30 anos, prazo em que o LNLS já estará utilizando plenamente a nova fonte de luz síncroton “Temos que preparar uma máquina que tenha flexibilidade para se adaptar às tecnologias que vierem e às demandas de pesquisas atuais e futuras”, reforça o físico.
Quando a primeira fonte foi desenvolvida, conta Brum, os cientistas não esperavam que ela fosse tão utilizada na área de biologia. “Não conseguíamos prever isso naquela época, mas hoje ela é muito usada para estudar proteínas”, conta.
Apesar da equipe de cientistas envolvidos no processo ser basicamente nacional, haverá uma forte colaboração com cientistas de outros países, como Reino Unido, França e Canadá, que já possuem projetos de colaboração com o laboratório brasileiro, para a idealização do equipamento. “Sempre vamos interagir com o exterior porque é uma tecnologia muito avançada, por isso assinamos convênios de colaboração com outros (laboratórios de luz) síncrotrons”, explica o diretor.
Via Internet
Uma das frentes de trabalho da equipe do LNLS visa possibilitar a realização de experimentos por meio da internet. Segundo Brum, a idéia é desenvolver mecanismos para que pesquisadores realizem experimentos operando remotamente. “Eles nos enviam uma amostra do material a ser analisado pelo correio e nós a colocamos na máquina”, conta o diretor. E o cientista controla o experimento por meio da internet em alta velocidade. “É claro que não é com todo experimento que isso poderá ser feito”, pontua o físico.
O fato é que nos próximos meses os primeiros testes deste conceito já estarão sendo realizados em colaboração com a Rede Nacional de Pesquisas, que é responsável pelo desenvolvimento da internet no Brasil. “Se tudo correr bem, estes laboratórios-web serão uma realidade em poucos anos”, frisa Brum.
No período de um a dois anos, explica o físico, já será possível acompanhar alguns experimentos pela internet. “Assim você não precisa enviar a equipe inteira para Campinas”, diz.
O LNLS atende atualmente mais de 1,6 mil pesquisadores externos por ano, realizando mais de 600 projetos de pesquisa nas mais diversas áreas. Ainda assim, conta o físico José Antônio Brum, há uma demanda que o laboratório não consegue atender, mesmo operando 24 horas por dia. “A nova fonte de luz, além do salto qualitativo, permitirá atender também a crescente expansão da comunidade científica e da tecnologia no País”, diz. A operação remota também ampliará as possibilidade de atender pesquisadores de laboratórios mais distantes.
Enquanto a nova máquina não é construída, a Fonte de Luz Síncrotron passa anualmente por uma atualização para atender à demanda da comunidade científica. Durante um mês no final do ano o aparelho fica desligado para a manutenção e realização de novas instalações.
“Este ano serão instalados, entre outras coisas, monitores de posição de feixe, para aumentar a estabilidade do feixe e será feita a preparação da máquina para a instalação no ano que vem de um dispositivo de inserção supercondutor, que aumentará a produção de raios X duros”, explica Brum. Se essas atualizações não forem feitas, diz o diretor, não é possível “fazer pesquisas na fronteira do conhecimento”.
Demanda científica é cada vez maior
As Fontes de Luz Síncrotron têm uma vida útil de aproximadamente 20 a 30 anos. Apesar do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) promover atualizações anuais, mudanças mais radicais são necessárias para atender à demanda de pesquisa da comunidade científica.
“Pretendemos que a nossa (atual fonte de luz) tenha uma vida útil de 25 anos. Se o Brasil quiser se capacitar para pesquisar novos materiais, precisa de uma nova ferramenta”, explica o diretor geral da ABTLuS, José Antônio Brum.
Hoje a fonte utilizada armazena elétrons com energia de 1,37 G e V (Giga eletron-volts). Na nova máquina, essa energia subirá para um valor entre 2 e 3 G e V, produzindo assim um fluxo muito mais intenso de raios X duros, por exemplo, o que permitirá aos cientistas “enxergar” melhor os materiais analisados. “Hoje as amostras de materiais são cada vez menores e mais difíceis de estudar, necessitando uma fonte de luz mais brilhante”, explica o físico.
Outro ganho previsto na nova máquina é o aumento da capacidade de concentrar o fluxo de luz numa pequena região do espaço. Com isso, a fonte terá ampliada a sua capacidade de analisar objetos em escala nanométrica com amostras muito pequenas.
A Fonte de Luz Síncrotron instalada em Campinas é a única da América Latina. Além disso ela é usada por cientistas do mundo todo. Mas são os argentinos os maiores usuários estrangeiros da máquina, correspondendo a 10% de toda utilização. Mas ela serve também cientistas de vários países, destacando-se África do Sul, Europa e Estados Unidos.
“Todos os síncrotrons estão saturados, por isso temos aqui cientistas de vários lugares do mundo, mesmo bem equipados com fontes de luz síncrotron, como a Europa e os Estados Unidos”, explica.
Saiba mais
Luz síncrotron é a intensa radiação eletromagnética produzida por elétrons de alta energia num acelerador de partículas. A luz síncrotron abrange uma ampla faixa do espectro eletromagnético: raios X, luz ultravioleta e infravermelha, além da luz visível, que sensibiliza o olho humano, são emitidas pela fonte.
É com esta luz que cientistas estão descobrindo novas propriedades físicas, químicas e biológicas existentes em átomos e moléculas, os componentes básicos de todos os materiais.
LNLS faz convênio com canadenses
A ABTLuS, que opera o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), assinou um convênio de cooperação com o Canadian Light Source (CLS). O intercâmbio tem como objetivo desenvolver instrumentação inovadora e de ponta para fontes de luz síncrotron.
Durante a cerimônia de assinatura do convênio, Jeffrey Cutler, diretor de Ciência Industrial do CLS, disse que foi dado o primeiro passo para um relacionamento que “será muito produtivo”. “Ambas as instalações têm missão similar de utilizar ferramentas e técnicas de síncrotron em áreas que beneficiam o desenvolvimento científico e tecnológico dos nossos países.”
Durante a assinatura do convênio o diretor geral da ABTLuS José Antônio Brum disse que as fontes de luz síncrotron “se transformaram em uma das mais valiosas ferramentas científicas de investigação de novos materiais, na área biomédica e em processos biológicos e químicos”.
O acordo estabelece uma estrutura geral de colaboração entre os dois laboratórios para a realização de projetos, desenvolvimento comum de conhecimentos especializados e intercâmbio de pessoal e idéias. As instituições já começaram a projetar e construir alguns dos componentes a serem utilizados nas instalações de difração de raios X planejadas para os respectivos síncrotrons.
No CLS, este trabalho beneficia as instalações de difração de raios X Brockhouse. Atualmente em fase de projeto, o setor Brockhouse é um projeto de 27,8 milhões de dólares canadenses dedicado à caracterização de estrutura de materiais, incluindo ligas e polímeros avançados, novos tipos de pilhas, ciência dos alimentos e produtos petrolíferos.
No LNLS, a colaboração ajuda a desenvolver uma linha de luz de difração de alto fluxo de raios X, atualmente em fase de projeto. A linha é parte de um projeto R$ 12 milhões custeado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e dedicado aos nanomateriais e à caracterização de ciência dos materiais.
(Correio Popular, 21/11)