Folha de S. Paulo, em 28/01/2009
Estrutura com 3 átomos de largura estica e encolhe
Cientistas brasileiros que estudam materiais na escala nanoscópica -da ordem de milionésimos de milímetro- incorporaram mais um objeto ao repertório da nanotecnologia: depois dos nanotubos e dos nanofios, uma nanossanfona.
Manipulando pequenas concentrações de átomos de prata, o grupo do físico Daniel Ugarte, da Unicamp, criou uma estrutura em quadrados capaz de esticar e depois se recolher. E a molécula, assim como o fole do instrumento musical, é oca.
“Relatamos a formação espontânea do menor nanotubo de metal possível com uma secção transversal quadrada durante o alongamento de prata”, escrevem Ugarte e colegas na revista “Nature Neuroscience”.
O experimento onde a estranha estrutura molecular foi observada foi “como separar um chiclete em dois pedaços”, explica o físico. Uma minúscula porção de prata é esticada até se romper. Durante uma breve fase intermediária do processo, formam-se fios com poucos átomos de espessura antes de os dois pedaços do metal se separarem definitivamente.
Para observar como os átomos se comportam, os pesquisadores usaram um microscópio de alta resolução. Mesmo sendo ultrapotente, o instrumento não fornece imagem nítida do material, e a determinação da estrutura é feita com cálculos que explicam as imagens.
Ugarte havia usado uma técnica similar em experimentos realizados em 2002, quando produziu nanofios de ouro com um átomo de diâmetro. O objetivo de seu grupo é entender como materiais se deterioram, porque nanoestruturas têm grande potencial de aplicação. A descoberta da nanossanfona, porém, não havia sido prevista por modelos de computador.
“A gente fez um experimento em condições diferentes”, disse Ugarte. “Obtivemos uma imagem que não conseguiríamos explicar com uma estrutura normal. A única forma de explicar os dados foi admitir que a estrutura seria oca.”
Segundo os físicos, a estrutura não é muito estável e só existe enquanto os átomos de prata são mantidos sob tração. Isso a impede de ganhar aplicações práticas como as dos nanotubos de carbono -material já usado em peças de máquinas que requerem alta resistência.
Segundo Ugarte, por enquanto, o mérito de seu novo trabalho é mostrar como a física experimental é importante numa área onde se deposita confiança demais nas previsões feitas por computador.
“As coisas muito pequenas podem se comportar de maneira diferente do que a gente pensa sobre elas num sistema clássico macroscópico”, diz.