Em novembro deste ano, o governo brasileiro realizou o lançamento da primeira etapa do Projeto Sirius – um gigantesco acelerador de elétrons de quarta geração. O nome é uma referência a Sirius, a estrela mais brilhante do céu noturno.
O equipamento científico foi construído na cidade de Campinas (SP) e seu formato e dimensão lembra o de um estádio de futebol. Ele está abrigado em um prédio de 68 mil metros quadrados, junto ao campus do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), órgão de pesquisa ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. As instalações devem consumir a energia elétrica de uma cidade com 80 mil casas.
Orçado em 1 bilhão e meio de reais, o projeto Sirius foi iniciado em 2012. Seus aceleradores representam a mais complexa estrutura de pesquisa científica já construída no Brasil. Quando estiver em atividade, ele será um laboratório aberto a usuários ligados às universidades, instituições de pesquisa e empresas.
Hoje existem quase 50 aceleradores similares ao Sirius no mundo. No entanto, eles são considerados de tecnologia inferior (terceira geração). Só há um outro equipamento comparável ao Sirius em operação – ele fica na Suécia. O acelerador brasileiro será o líder mundial na geração de luz síncrotron, podendo suportar até 40 pesquisas simultâneas.
Aceleradores e a radiação síncrotron
A estrutura física da matéria é composta por átomos. Aceleradores são grandes laboratórios que usam carga elétrica para acelerar partículas a velocidades próximas à da luz. Com isso, conseguem quebrar os componentes da matéria, como as partículas elementares do átomo.
Existem diversos tipos de aceleradores como Aceleradores de Elétrons, Colisores de Partículas e os Aceleradores de Prótons. A estrutura desses equipamentos pode ser comparada a megatúneis, que podem ser retos ou em forma de anel e ter vários quilômetros de extensão.
No túnel existe uma câmera de ultra-alto vácuo, que delimita por onde as partículas circulam e permite que permaneçam armazenadas em um ambiente desobstruído. O local possui ainda um conjunto de eletroímas que guiam a trajetória das partículas longo do percurso.
O Sirius já foi comparado a uma “fábrica de luz”. Ele possui um anel de 518,4 metros de circunferência e mais de mil ímãs. Por meio dos campos magnéticos, o equipamento acelera feixes de elétrons na velocidade de 1,07 bilhão de quilômetros por hora – próxima à da luz. Cada elétron atinge uma energia equivalente a um choque de 3 bilhões de volts.
Como consequência da aceleração, o Sirius produz uma radiação de alto brilho- a luz síncrotron. Ela possui amplo espectro, que abrange o infravermelho, o ultravioleta e os raios X. Esse feixe de luz pode ficar armazenado por várias horas. Durante esse período, os pesquisadores usam a luz para analisar a estrutura atômica do material, revelando suas propriedades químicas e estruturais.
O nome síncrotron é uma junção das palavras “sincronicidade” com “elétron”. Para entender a diferença entre uma luz comum e a síncrotron, imagine uma comparação com uma lanterna e um laser point. Na lanterna, a divergência da luz é maior, distribuindo a luz em mais direções, mas com alcance relativamente pequeno. Já num laser point, a luz é concentrada em uma única direção, permitindo maior alcance.
O Sirius é considerado melhor do que outros aceleradores porque os fótons estão concentrados em uma área menor, o que gera um brilho mais intenso. O novo acelerador brasileiro permitirá extrair feixes muito concentrados dessa luz e realizar imagens mais rapidamente. No acelerador UVX, o acelerador mais antigo do Brasil, uma imagem demora cerca de 40 minutos para se obter. No Sirius, levará alguns segundos.
Algumas aplicações científicas e métodos só podem ser realizados em fontes de luz com alto brilho, que funcionam como um “microscópio gigante”. Será possível iluminar a natureza microscópica de materiais e revelar, em alta resolução e em três dimensões, as estruturas dos mais variados materiais orgânicos e inorgânicos como proteínas, vírus, rochas, plantas, polímeros, ligas metálicas, fósseis ou células.
Na prática, aceleradores podem ser usados para diversas aplicações na indústria, nas pesquisas em Física Nuclear, na Biologia, Medicina, Ciência dos Materiais, Química e outras áreas do conhecimento científico.
O Brasil e os aceleradores
Além do recém-inaugurado Sirius, o Brasil já possui um acelerador de partículas, o UVX, que funciona desde 1997 para pesquisas. Ele foi o primeiro acelerador de elétrons em operação na América Latina. O UVX é um acelerador de segunda geração e a energia dos raios emitidos é relativamente baixa, o que limita o tamanho do feixe. Apesar das limitações o UVX é amplamente usado para pesquisa. Em seus laboratórios, já foram desenvolvidas pesquisas sobre o câncer, antibiótico contra o Parkinson, fertilizantes para uso em agricultura, medicamentos contra bactérias, impressão digital do vírus zika, entre outros estudos.