Correio Popular, 13/01/2018
Leandro Ferreira/AAN
Obras de construção do Sirius, que será um dos mais modernos laboratórios de luz síncrotron do mundo
Obras de construção do Sirius, que será um dos mais modernos laboratórios de luz síncrotron do mundo
Mais um corte de verbas no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) ameaça a sobrevivência de centros de pesquisa em todo o País. Em Campinas, especificamente, o Centro Nacional de Pesquisa em Energias e Materiais (CNPEM), que abriga o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), o Centro Tecnológico da Informação (CTI) Renato Archer e a Embrapa, está diretamente ligado ao MCTIC e sofrerá cortes drásticos. Uma das maiores preocupações é com a construção do Sirius, no campus do CNPEM, que abrigará o acelerador de partículas para produção da luz síncrotron.
Em 2017, por exemplo, só a verba destinada para investimentos já era considerada insuficientes por representantes de centros de pesquisa e entidades da categoria. O valor de R$ 5,81 bilhões ainda teve um contingenciamento de 44%, e restaram R$ 3,27 bilhões para serem usados. Este ano, a fatia do orçamento federal para investimento em ciência será 25% menor, chegando aos cerca de R$ 4,55 bilhões. Se o ano passado já foi de receio em relação ao dinheiro para manter os centros de pesquisa funcionando, 2018 promete uma situação de preocupação.
O orçamento federal, aprovado pelo Congresso Nacional no dia 13 de dezembro do ano passado e sancionado pelo presidente Michel Temer no dia 3 de janeiro deste ano, prevê uma redução de pouco mais de 18% no orçamento total do MCTIC em comparação às verbas do ano passado. Para o CNPEM, CTI e LNNano, o valor destinado para cada um cairá 39%. No caso do Sirius, que recebe verba do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a redução será de 33%. O Fundo Nacional de Desenvolvimento Tecnológico (FNDCT), que financia o Programa Institutos Nacionais, terá redução de 9,5%, e em Campinas há seis institutos que estão sob este “guarda-chuva”.
O diretor do CTI, Victor Mammana, conta que além dos cortes das verbas vindas do ministério, a contratação de pesquisas e projetos por parte da iniciativa privada também vem caindo. “Algumas empresas privadas que contratavam os projetos estão fechando e outras estão reduzindo a demanda devido à crise.” Há a preocupação ainda de que a verba que já foi reduzida nos últimos três anos sofra novamente um contingenciamento, semelhante ao que ocorreu no ano passado. “Tem também a questão de que projetos contratados via Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), agência de fomento federal, em 2014, 2015 e 2016, estão terminando, e mesmo que ocorram novos chamados, os recursos demoram a chegar. Houve um grande desenvolvimento nesta época, e agora estamos preocupados com a continuidade. Há dinheiro da Finep para empréstimo, mas não de subvenção ou outras formas de fundo perdido”, disse.
Segundo Mammana, ele tem notado que em outros insitutos de pesquisa em Campinas, que ainda possui unidades subordinadas ao Estado e particulares, estão havendo demissões. No caso do CTI, a preocupação com pessoal é em torno das aposentadorias já que, de acordo com ele, muitos funcionários que já atingiram os requisitos para se aposentar, mas ainda atuavam no local “por amor à profissão”, estão se retirando por medo da reforma previdenciária. “No ano passado tínhamos 145 servidores, e agora estamos com 110, mas se saírem todos os que trabalham aqui desde o começo, uma instituição com 35 anos de existência, e que já podem se aposentar, vamos chegar a 80 pessoas apenas”, disse o diretor do CTI.
O diretor-geral do CNPEM, Rogério Cézar de Cerqueira Leite, e o responsável pelo LNLS não foram encontrados até o fechamento desta edição. Também não houve resposta sobre o corte de verbas para o Sirius, que pertence ao CNPEM. Em entrevistas no ano passado, Cerqueira Leite afirmou que se os cortes de verbas continuassem, o CNPEM teria que reduzir o quadro de pessoal e linhas de pesquisa. No segundo semestre do ano passado, o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), também abrigado no CNPEM, teve 40 funcionários desligados. À época, Cerqueira Leite afirmou ao Correio Popular que as demissões ocorreram “devido ao término de um projeto financiado por uma empresa privada e à reestruturação das frentes de ação do CTBE”. “O CNPEM tem adotado, ao longo dos últimos tempos, diferentes ações para adequar o custo de sua operação ao orçamento restritivo, como revisão de contratos com fornecedores, redução de investimentos em suas instalações, adiamento de alguns novos projetos. O corte de pessoal é considerado uma das últimas opções. Ainda assim, para preservar a operação do CNPEM e as atividades de seus quatro laboratórios nacionais, pode haver necessidade de adequação dos custos com pessoal à realidade financeira do Centro.”
Questionado sobre a possibilidade de novas contratações, na mesma entrevista ele informou que isso só ocorrerá “se houver aumento do orçamento do CNPEM – reduzido em 42% neste ano (2017).”
O que diz o MCTIC
Em nota, o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) informou que o governo federal teve que adequar o orçamento “diante do cenário de recessão econômica e de baixa arrecadação ocorrido a partir de 2014”. De acordo com o órgão, 99% das verbas para investimento já foram empenhados, atingindo o limite orçamentário de cerca de R$ 4,55 bilhões.
Apesar da redução das verbas, o ministério afirma que a manutenção das atividades dos institutos e das organizações vinculadas é ponto prioritário e fundamental para o desenvolvimento do Brasil, “inclusive para criar as condições sustentáveis necessárias para a manutenção dos cientistas no País e o aperfeiçoamento de seus polos científicos e tecnológicos”.
Para este ano, o plano do MCTIC é manter contato com a área econômica para fazer solicitação de créditos adicionais e outras providências, com o objetivo de garantir recursos que sejam “compatíveis com a importância do tema”.
Especificamente sobre o CNPEM, a nota do ministério informou que tem atuado para garantir o repasse mais rápido possível dos R$ 218 milhões já previstos no orçamento deste ano para o Sirius para dar continuidade às obras e instalações. “O Sirius é o mais importante projeto da ciência brasileira, tem recursos assegurados e obras em andamento. Deve ter suas operações iniciadas ainda em 2018.”
Repercussão: Notícias de Campinas;