Correio Popular em 13/09/2017
No meio da crise e desmonte que a ciência e tecnologia brasileira está vivendo, a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) está lutando na Justiça para impedir a alienação (leilão) de áreas da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento que mantêm pesquisas em andamento.
A primeira tentativa da entidade foi impetrar um mandado de segurança junto à 6ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo com o objetivo de impedir a audiência pública que acabou sendo realizada em 25 de agosto, no Centro Experimental do Instituto Biológico de Campinas, aprovando a alienação de uma área total de mais de 600 hectares, que corresponde a patrimônios dos Institutos de Zootecnia, Biológico e da Apta Regional – DDD, localizados em Araçatuba, Pindamonhangaba, Itapetininga, Itapeva, Tatuí, Nova Odessa e Campinas.
Como a liminar foi negada, a APqC entrou com um embargo declaratório para, ao menos, amenizar o impacto nas pesquisas em andamento.
O presidente da APqC, Joaquim Adelino Júnior, explica que, enquanto algumas áreas podem ser consideradas “dispensáveis”, de outras não haveria como abrir mão sem prejuízo do desenvolvimento de pesquisas. Assim, a luta agora se restringiu à manutenção de áreas em Jundiaí, Nova Odessa, Itapeva e Itapetininga. Mesmo assim, embora até abra mão das áreas em Campinas, Tatuí e Araçatuba, a entidade exige que parte do dinheiro da venda seja revertida para pesquisas. O departamento jurídico da entidade acredita que ainda neste ano a Justiça decida sobre o caso.
Segundo Adelino Júnior, a região de Campinas é uma das mais penalizadas no País pelos cortes financeiros e desmonte de institutos de pesquisa estaduais. Além do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), cortes de verbas que chegam a 40% e redução dos quadros de pesquisadores afetam instituições como Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Instituto Biológico (IB), Instituto de Zootecnia de Nova Odessa, Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM) e Centro de Tecnologia da Informação (CTI). Sem contar o acelerador de partículas Sirius, o maior equipamento de pesquisa em construção no País, que está com as obras dentro do prazo, mas o ritmo de liberação de verbas preocupa e a manutenção de pesquisadores no próximo ano é uma incerteza.
Essa crise em órgãos estaduais e federais de pesquisa pode interromper estudos e execução de obras, além do risco de corte de pessoal. Justamente por causa da precarização dos centros de pesquisa ligados ao governo estadual e federal, pesquisadores lançaram a campanha “Conhecimento Sem Cortes”, para tentar revogar os cortes no orçamento federal para as áreas de educação, ciência, tecnologia e educação. Eles estão promovendo manifestações em todo o País, alertando para a situação precária da ciência no Brasil.
“Três décadas atrás, a Secretaria Estadual de Agricultura, à qual está ligada a maioria dos institutos de pesquisa da nossa região, recebia 4% do orçamento do Estado. Atualmente, o percentual é de 0,58%, e, ainda por cima, só um terço vai para pesquisa”, lamenta o presidente da APqC.
Pesquisadores
Ele acrescenta que nos últimos anos o número de pesquisadores e técnicos nos institutos de pesquisas estaduais está caindo sem parar. “Os salários baixos fazem com que muitos pesquisadores busquem trabalhos em outros lugares. Também não há reposição das vagas abertas pelos que se aposentam; o último concurso regular foi realizado em 1988”. De acordo com ele, nos institutos ligados à Secretaria de Agricultura, 47% das vagas de pesquisadores e 77% das vagas e técnicos estão abertas.
Na opinião de Adelino Júnior, por trás de movimentações como o leilão de áreas está tanto o esforço dos governos para “fazer caixa” como “uma política deliberada do capital multinacional, de quebrar a autonomia tecnológica brasileira e impor a venda de suas tecnologias e produtos”.
Secretaria
Procurada pelo Correio Popular, a Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento emitiu uma nota declarando apenas: “Informamos que foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo a Lei nº 16.338/2016, que autoriza a venda das 12 áreas administradas pela Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), ligada a esta Pasta, dentre elas todas as citadas pela reportagem. O processo de alienação está tramitando nas instâncias governamentais competentes.”