Por G1 Globo em 13/09/2021
Estratégia testada com sucesso em modelos animais poderia ser utilizada com qualquer tipo de tumor, explica cientista do CNPEM, em Campinas (SP); próximo passo é analisar eficiência em cultura de células humanas.
Por Fernando Evans, G1 Campinas e Região
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Pesquisador Marcio Chaim Bajgelman, do CNPEM, trabalha no desenvolvimento de técnica antitumoral — Foto: CNPEM/Divulgação
Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP), testaram uma nova estratégia de combate ao câncer que utiliza uma molécula sintética capaz de interferir no DNA de células de defesa do organismo para que o sistema imunológico possa atacar o tumor.
Segundo o pesquisador Marcio Chaim Bajgelman, os tumores utilizam artifícios para escapar da ação do sistema imunológico, e a técnica, testada com sucesso em modelos animais, mostra que é possível ‘desabilitar’ a atividade imunossupressora desenvolvida pelas chamadas “células T regulatórias”.
Bajdelman explica que o câncer aparece a partir de células do próprio organismo que adquiriram uma mutação e que começam a crescer indefinidamente. Por ser formado por células do organismo, o tumor consegue escapar de sinalizações para o sistema imune atacá-la.
Uma das estratégias para isso é que os tumores secretam substâncias que atraem as células T regulatórias, que funcionam como um “guardiãs” para que o sistema imunológico não ataque o próprio organismo.
É justamente nessa área que os cientistas do CNPEM conseguiram atuar. Com ajuda de uma molécula sintética, chamada aptâmero quimérico, que carrega um código genético para interferir no DNA dessa células, foi possível impedir a expressão da proteína intracelular Foxp3. É esse marcador que diferencia das células T regulatória das efetoras, que vão combater o câncer.
Segundo Bajgelman, a taxa de eficiência observada para inibir o Foxp3 com o uso do aptâmero foi de 60%, o que é considerado promissor. A técnica poderia ser utilizada para o combate de todos os tipos de câncer.
“Imagine dois lutadores de boxe. Se você consegue diminuir em 30, 40% da força de um deles, é suficiente para que o outro vença. Em termos moleculares, biológicos, não é preciso inibir 100% para vencer. Com 60% obtivemos resultados bem interessantes com culturas de células e modelos animais”, explica o pesquisador.
Próximos passos
O estudo foi publicado na revista Molecular Therapy Nucleic Acids e o próximo passo da pesquisa é obter resultados semelhantes em ensaios com cultura de células humanas, que já vem sendo desenvolvidas no centro de pesquisa em Campinas.
“Agora vamos transpor as sequências que foram desenhadas para genes de camundongos e trabalhando para testes em células humanas. Já temos alguns resultados in vitro, e estamos aperfeiçoando o sistema. É um trabalho que começou em 2012, e conseguimos gerar tecnologia nacional. Acredito que dentro de uns quatro anos, possamos partir para a parte de ensaios clínicos”, projeta o pesquisador.
Combinando esforços
Entre as ações desenvolvidas no CNPEM para o combate ao câncer estão as vacinas antitumorais, que diferente dos imunizantes capazes de prevenir doenças, são feitas a partir de células tumorais do próprio paciente geneticamente modificadas em tratamentos que já se mostraram promissores.
“A vacina consiste em modificar células tumorais para que produzam imunomoduladores. Estes imunomoduladores estimulam as células de defesa do organismo a identificar e eliminar o câncer”, explica Bajgelman.
Segundo o pesquisador, utilizar a vacina combinada com a técnica do aptâmero quimérico podem potencializar as terapias contra o câncer. A expectativa é que no futuro essas técnicas possam ser combinadas com outras estratégias já utilizadas, como a quimioterapia, diminuindo a quantidade de fármaco aplicada e melhorando a qualidade de vida do paciente em tratamento.
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Sirius, laboratório de luz síncrotron de 4ª geração, instalado no CNPEM, em Campinas — Foto: Nelson Kon
O que é o CNPEM?
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) é uma organização social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações (MCTI). O centro é constituídos por quatro laboratórios nacionais e abriga o Sirius, laboratório de luz síncrotron de 4ª geração.
Principal projeto científico do governo federal, o Sirius atua como uma espécie de “raio X superpotente” que analisa diversos tipos de materiais em escalas de átomos e moléculas.
Além do Sirius, há apenas outro laboratório de 4ª geração de luz síncrotron operando no mundo: o MAX-IV, na Suécia.