Por O Globo em 27/10/2021
Naira Trindade e Bruno Góes
BRASÍLIA – Em uma reunião com deputados no Ministério da Economia, nesta terça-feira, o ministro Paulo Guedes, considerou como ‘burrice’ o baixo empenho de recursos de um fundo de pesquisas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, dirigido pelo ex-astronauta Marcos Pontes.
Guedes argumentou que, ao não usar o dinheiro, a pasta de Pontes faz uma ‘confissão’ de que o uso daquela quantia não estava entre as prioridades do ministério.
Guedes também fez um desabafo alegando que ‘às vezes se pergunta o que está fazendo no governo’, por perceber que colegas ministros têm culpado a pasta da Economia por todos os remanejamentos orçamentários do governo.
As declarações do ministro foram dadas a integrantes da Comissão de Ciência e Tecnologia, que tentam reverter o remanejamento de R$ 600 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), e antecipadas pela “Folha de S. Paulo”.
Inicialmente, a pasta teria à disposição R$ 655,4 milhões no fundo, mas, com o represamento de 86,3% do valor previsto, restaram R$ 89,8 milhões.
Segundo integrantes da equipe econômica, o remanejamento ocorreu porque Marcos Pontes empenhou até outubro somente R$ 393 milhões dos R$ 4,6 bilhões do fundo.
Na reunião, Guedes mostrou os números para os deputados, dizendo ter certeza de que não faltam recursos para o ‘acelerador de partículas’, sinalizando que o ministério da Ciência e Tecnologia traçou outras prioridades para o orçamento.
A menção é sobre o Sirius, acelerador de partículas de 68 mil metros quadrados inaugurado em 2018 que é a maior e mais complexa infraestrutura de pesquisa já construída no Brasil.
Orçado em R$ 1,8 bilhão, ele promete viabilizar estudos nacionais de qualidade sem precedentes no mundo.
Para Tarcísio de Freitas, elogios
Aos deputados, o ministro elogiou o colega Tarcísio de Freitas, que comanda o Ministério de Infraestrutura, que, segundo Guedes, empenha os recursos ao ponto de ter de pedir mais dinheiro ao presidente Jair Bolsonaro para concluir os projetos da pasta.
Ele também criticou o ministro Onyx Lorenzoni por, no passado, tê-lo culpado por remanejar recursos de crianças com Zika, quando, na visão de Guedes, a economia apenas remanejou uma verba que não estava empenhada. Neste momento, Guedes se questionou sobre ‘o que estaria fazendo no governo’.
Impasse com Pontes desde outubro
O impasse com o ministro Marcos Pontes se arrasta desde meados de outubro. Na última reunião ministerial no Palácio do Planalto, Pontes foi criticado por colegas do governo após das entrevistas atacando o remanejamento da verba do fundo de pesquisas.
Durante o encontro, ministros argumentaram com o colega que não havia justificativa para enviar mais recursos ao ministério.
Justificaram que, ao congelar parte do dinheiro que poderia ir para a pasta de Marcos Pontes, o governo priorizou o envio de recursos para a produção de radiofármacos, essenciais para a medicina nuclear, que é aplicada em tratamentos de câncer por radioterapia e na realização de exames de imagem, por exemplo.
Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, incomodou o fato de Marcos Pontes ter feito críticas públicas ao governo durante em entrevistas, nas redes sociais e durante uma audiência na Câmara, antes de tentar discutir internamente com os ministros sobre realocações das verba.
Na avaliação de integrantes do governo, para agradar a comunidade científica, Pontes expôs Bolsonaro.
Por outro lado, um ministro da ala política do governo revelou, sob sigilo ao GLOBO, que Paulo Guedes é uma pessoa “que desagrega”o governo e que “causa muita confusão”.
Segundo este integrante do primeiro escalão, o ministro da Economia é muito eficiente para falar “não”, mas pouco contribuiu com ideias e soluções para o governo.