Por G1 Globo em 20/12/2020
Uma espuma criada da combinação de nanocelulose e látex de borracha pode ser uma importante ferramenta em ações de despoluição envolvendo óleos e solventes orgânicos. Produto 100% natural e reutilizável, a “espuma verde” desenvolvida por uma pesquisadora do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), em Campinas (SP), foi capa de uma revista internacional e teve a patente requerida.
Testes em laboratório mostraram que a espuma tem capacidade de absorver poluentes até 50 vezes superiores a sua massa, além de apresentar eficiência nessa absorção mesmo após 20 ciclos de reutilização.
A pesquisadora Rubia Figueredo Gouveia conta que o uso de nanocelulose para criar estruturas semelhantes a dessa espuma não é algo inédito, mas a grande diferença está na combinação dele com o látex de borracha natural, que substitui derivados de petróleo ou outros agentes para manter a estrutura 3D das fibras.
“A gente compara a estrutura criada pela nanocelulose como se fosse um espaguete, e o látex é que dá essa liga para ele não se desfazer”, explica Rubia.
“A gente compara a estrutura criada pela nanocelulose como se fosse um espaguete, e o látex é que dá essa liga para ele não se desfazer”, explica Rubia.
A pesquisadora comenta que além de garantir a manutenção dessa estrutura, uma vez que apenas a nanocelulose acabaria desmanchando em água, por exemplo, o látex também possui uma “afinidade” com diferentes tipos de óleos. “É um adesivo natural da natureza”, define.
A espuma que é concebida através de um processo de congelamento da água, chamado de liofilização, apresenta mais de 90% de porosidade – e por isso pode absorver tanto óleo e/ou solvente. No LNNano foram testados diferentes produtos, como glicerol, gasolina, óleo diesel, óleo de milho, óleo de soja e óleo de silicone, entre outros.
A “afinidade” com cada produto com a espuma influenciou no tempo de absorção, mas os resultados, na avaliação da cientista, mostrou que em todos os cenários apresenta rapidez – variou entre 1 e 10 segundos.
Do bagaço da cana
Um outro detalhe que amplia o caráter “verde” da espuma é a possibilidade de que as nanofibras de celulose para criar o produto podem ser obtidas a partir do bagaço da cana-de-açúcar.
“Essa é uma temática nossa, que é o trabalho de aproveitamento de biomassas em geral. Extrair componentes de um resíduo que poderia ser descartado e transformar em componentes com valor agregado”, conta.
Outras aplicações
Rubia conta que dos primeiros trabalhos ao produto final, foram três anos de pesquisas e testes com materiais porosos. No LNNano, várias pesquisas caminham em conjunto, e a parte mais intensa do trabalho com a espuma verde ocorre desde 2019.
Apesar do material já mostrar eficiência e aplicabilidade em ações de despoluição, Rubia vê o trabalho como inicial, e acredita que a estrutura criada pela combinação de nanocelulose e látex de borracha natural pode ter diversas aplicações no futuro, na indústria e em produtos finais.
“É uma estrutura muito porosa que, dependendo do tipo de modificação, pode abrir uma gama enorme de aplicações, como isolamento térmico e acústico, por exemplo”, detalha.
“É uma estrutura muito porosa que, dependendo do tipo de modificação, pode abrir uma gama enorme de aplicações, como isolamento térmico e acústico, por exemplo”, detalha.
Sirius
O LNNano é um dos quatro laboratórios nacionais que integram o CNPEM, organização social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTIC).
Dentro do CNPEM está o superlaboratório Sirius, maior projeto científico brasileiro e que iniciou suas operações com a primeira linha de luz neste ano, em caráter emergencial, para auxiliar no combate ao novo coronavírus.
Laboratório de luz síncrotron de 4ª geração, o Sirius atua como uma espécie de “raio X superpotente” que analisa diversos tipos de materiais em escalas de átomos e moléculas.
Para observar as estruturas, os cientistas aceleram os elétrons quase na velocidade da luz, fazendo com que percorram o túnel de 500 metros de comprimento 600 mil vezes por segundo. Depois, os elétrons são desviados para uma das estações de pesquisa, ou linhas de luz, para realizar os experimentos.
Esse desvio é realizado com a ajuda de ímãs superpotentes, e eles são responsáveis por gerar a luz síncrotron. Apesar de extremamente brilhante, ela é invisível a olho nu. Segundo os cientistas, o feixe é 30 vezes mais fino que o diâmetro de um fio de cabelo.