Radio Sputnik Brasil, em 23/08/16
Pesquisadores brasileiros vêm realizando desde maio uma experiência absolutamente inédita em termos de avaliação de sobrevivência de microrganismos em ambientes hostis.
Em maio deste ano, pesquisadores liderados por Douglas Galante, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas, e Fábio Rodrigues, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), enviaram microrganismos diversos para um longo passeio pelo espaço, atingindo uma altitude de 30 mil metros, já na estratosfera.
Os microrganismos foram lançados numa sonda acoplada a um balão meteorológico, numa experiência realizada em 14 de maio, com mais de duas horas de duração. Segundo Douglas Galante, especialista em Astrobiologia, “diversas espécies de microrganismos foram levadas lá para cima, dentre elas o famoso extremófilo Deinococcus radiodurans, bactéria notória por sua alta resistência a doses agressivas de radiação de alta intensidade, como raios X e gama”.
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o Professor Douglas Galante detalhou os objetivos e o modo pelo qual a experiência foi realizada: “Este é um experimento que nós realizamos em alta atmosfera, na estratosfera terrestre. Ele faz parte da nossa linha de pesquisa, na área de astrobiologia, área relativamente recente na pesquisa científica, que procura entender o fenômeno da vida no universo de uma maneira um pouco mais ampla do que a Biologia convencionalmente faz.
” Douglas Galante explica os objetivos da pesquisa desenvolvida por sua equipe: “A ideia é realmente entender quais os fenômenos físicos e naturais que levam à origem da vida em um planeta; como essa vida se distribui e se adapta às mais diferentes condições; se existe vida em outros planetas e como desenvolver metodologias e estratégias científicas para pesquisar esse tipo de vida, sempre usando o máximo de rigor científico possível nesse trabalho.”
O pesquisador do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas, conta que “esse foi um primeiro voo que realizamos em parceria com a Escola de Engenharia da USP de São Carlos. A ideia foi expor extremófilos, que são microrganismos capazes de lidar com as mais severas condições ambientais no ambiente de alta atmosfera, e ver se eles seriam capazes de sobreviver ou não. A ideia de usar a estratosfera foi porque o ambiente dela, que está a 30 quilômetros de altitude (muito mais alto do que voam os aviões comerciais), é muito parecido com o ambiente que existe na superfície de Marte. A temperatura é parecida, mais ou menos —40º, —50ºC, a pressão atmosférica é parecida, é muito rarefeito o ar nessas condições, é uma pressão da ordem de um milésimo da pressão aqui no nível do mar. O fluxo de radiação solar que chega ali, principalmente ultravioleta, também é similar ao existente em Marte. Esse ambiente da estratosfera é parecido com o que um microrganismo enfrentaria se ele estivesse exposto na superfície de Marte.
” O Professor Douglas Galante afirma, finalmente, que a proposta da experiência num ambiente parecido com Marte era saber se poderia ser usado como um ambiente análogo para fazer testes.
“Será que esse microrganismo sobreviveria ou não? Testamos vários microrganismos, alguns que são organismos-modelo que todo mundo estuda em laboratório, como o Deinococcus radiodurans, que é uma bactéria super-resistente, e comparamos com outros que o nosso grupo isolou de ambientes naturais, em especial algumas leveduras que nós isolamos do deserto do Atacama. Testamos e comparamos a resistência deles, e um dos primeiros resultados, que estamos preparando agora, é que vários desses microrganismos seriam capazes de sobreviver a essas condições. Inclusive conseguimos demonstrar que as leveduras que isolamos são ainda mais resistentes que a Deinococcus a essas condições. Isso é uma coisa nova. Estamos mostrando que existem novos recordes de sobrevivência.”