Folha de S. Paulo, 21/03/2016
Sabine Righetti
Fazer cocô num potinho não é fácil pra ninguém. Agora imagine se a pessoa tiver problema de mobilidade, for idosa ou estiver doente —caso da maioria de quem precisa fazer exame de fezes.
Um casal —originalmente da área de comunicação— resolveu criar um produto específico para esse exame.
É uma espécie de “sacola” esterilizada, batizada de ColOff, que cobre o vaso sanitário e permite que o paciente use-o como de costume.
Depois, a pessoa coleta uma parte das fezes e a coloca, enfim, no potinho que será encaminhado ao laboratório.
“O ColOff é como a seringa que coleta o sangue e o coloca num tubinho”, explica Eliezer Dias, 39, um dos fundadores da start-up que leva o nome do produto. “Assim como não coletamos o sangue no tubinho, não precisar coletar fezes num potinho.”
A ideia é simples, mas ninguém tinha pensado nisso antes. O casal conseguiu o registro do ColOff na agência de patentes dos EUA, a USPTO, em 2010. Já conquistaram mercado de países como Nova Zelândia e Austrália.
No Brasil, o pedido de patente segue em análise (o tempo médio de análise patentária aqui é de sete anos).
O ColOff, no entanto, já está no mercado nacional por cerca de R$ 5 a unidade —a produção atual é de 50.000 “sacolas” por mês.
Um dos clientes é o laboratório do hospital Albert Einstein, em São Paulo, um dos melhores do país. Lá, quem vai fazer o exame em casa recebe um potinho, o ColOff e instruções de como usá-lo.
NO JORNAL
“Antes, tinha paciente que usava jornal para coletar o exame ou simplesmente desistia e sumia”, diz Priscila Cirulli, coordenadora da coleta externa do Einstein.
“Hoje, temos um retorno de 100% dos exames”, diz.
O problema de o paciente “desistir e sumir” quando o exame é solicitado pelo médico é que a análise das fezes é importante para o diagnóstico de uma série de doenças.
É o caso de detecção de parasitas e da identificação de sangue oculto nas fezes, indicador de câncer colorretal.
Há cientistas que defendem que a análise das fezes, sozinha, fecha o diagnóstico desse câncer, sem a necessidade de colonoscopia —exame mais caro e invasivo.
Foi uma experiência pessoal com câncer colorretal que motivou Dias e sua mulher, Carolina Fagundes, 40, a criar o ColOff.
A tal sacola esterilizada foi a técnica caseira que eles desenvolveram para facilitar a vida da mãe dela, Ivonice Fagundes, então bailarina, diagnosticada com a doença.
“Ela fazia exame de fezes semanalmente por dois anos para acompanhar a evolução da massa tumoral”, conta Fagundes. “Era cada vez mais difícil conseguir que ela se equilibrasse num potinho. Tinha alto risco de queda.”
Antes de falecer, em 2008, aos 57 anos, a mãe dela teria pedido que o casal patenteasse e vendesse a “sacola”.
SEM CONVÊNIO
Fagundes e Dias largaram seus trabalhos, tiraram os quatro filhos do ensino privado, cortaram o plano de saúde e abriram a start-up.
Agora, estão atrás de investimentos para escalar a produção das sacolinhas.
O casal também está investindo em pesquisa. Eles estão desenvolvendo um teste rápido de exame de fezes para ser usado em áreas remotas. Isso em parceria com o CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energias e Materiais).
O projeto teve aporte de R$ 1,4 milhão da agência federal de estudos Finep.
Em regiões longínquas, esse exame é ainda mais difícil. As fezes estragam antes de chegar ao laboratório. “Não podemos mais deixar que as pessoas morram de diarreia no Brasil”, diz Fagundes.
Repercussão: Portal da Enfermagem