Folha de S. Paulo em 22/10/2020
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Beatriz Montesanti
Uma gigante estrutura de aceleradores de elétrons instalado no interior de São Paulo pode ser o berço de um Vale do Silício da biotecnologia no Brasil. É o que almejam governo e cientistas envolvidos no projeto Sirius, considerado a maior e mais complexa empreitada científica do país.
O Sirius é composto por três aceleradores de elétrons, capazes de gerar a luz síncrotron, espectro que viaja a uma velocidade próxima a 300 mil km/segundo e permite visualizar partículas microscópicas com nitidez. Sua infraestrutura tem o tamanho de um campo de futebol e contou com um investimento de R$ 1,8 bilhão.
O projeto foi aprovado e teve seu início durante o governo de Dilma Rousseff (PT).
Nesta quarta (21), foi inaugurada a primeira estação de trabalho do sistema, batizada Manacá, no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (93 km de São Paulo). A cerimônia contou com a presença do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes.
“Considerando as grandes empresas que podem se beneficiar dessa obra, por que não fazemos deste lugar o Vale do Silício da biotecnologia?”, perguntou o presidente.
A ideia é defendida por Antônio José Roque da Silva, diretor-geral do CNPEM e chefe do projeto de construção do Sirius. “O conhecimento produzido aqui vai permitir ao país competir mundialmente. O Brasil vai poder se posicionar no mundo de maneira diferenciada.”
“Recurso em pesquisa e ciência não é gasto, é investimento”, completou o ministro Marcos Pontes.
A Manacá é dedicada especificamente aos estudos de moléculas biológicas. E a partir de agora, estará aberta para a comunidade científica como um todo. O equipamento poderá ser utilizado para pesquisas em áreas estratégicas, como saúde, agricultura, energia e meio ambiente, e em parceria com o setor produtivo.
Propostas submetidas para o uso da estação de trabalho serão avaliadas por tuna comissão externa. No caso de pesquisas acadêmicas, não haverá custos. Já empresas arcarão com os gastos de pesquisas que tenham segredo estratégico, mas poderão utilizar a estação de forma gratuita, caso concordem em tornar públicas medidas de materiais e conclusões.
“Vamos disponibilizar à comunidade científica um dos melhores instrumentos do mundo para trazer avanços nessas áreas. Podemos pesquisas medicamentos para doenças como o Alzheimer, a esquizofrenia, o câncer. Pesquisadores do mundo todo que estiverem precisando de um equipamento muito requintado para entender interações muito finas poderão vir aqui”, explica à Folha Mateus Cardoso, pesquisador do CNPEM.
Com sua inauguração, o centro de pesquisas aposentou o UVX, primeiro acelerador de elétrons da América Latina, projetado na década de 1980. “É como se antes tivéssemos um Chevette e agora andássemos em tuna Ferrari”, compara Cardoso.
Nos últimos meses, a estação esteve disponível em sua fase de testes para experimentos relacionados à Covid-19. Cientistas puderam, ao longo deste período, analisar mecanismos de inibição do vírus, e como as moléculas interagem para impedir sua réplica. Os resultados desses experimentos ainda não foram divulgados.
Outras cinco linhas de luz, com são chamadas as estações de pesquisa, estão em fase de montagem e devem ser concluídas até o final deste ano. Ao todo, a estrutura comporta até 40 estações. Elas serão independentes entre si, o que permitirá que pesquisadores trabalhem simultaneamente.
Considerando as grandes empresas que podem se beneficiar dessa obra, por que não fazemos deste lugar o Vale do Silício da biotecnologia?