Blog Mensageiro Sideral – Folha de S.Paulo, em 20/11/2013
Um quarteto internacional de pesquisadores diz ter identificado os primeiros sinais indisputáveis de vida encontrados na Terra. Os fósseis remontam a 3,48 bilhões de anos atrás e foram localizados na Austrália.
Nora Noffke, da Old Dominion University, em Norfolk (EUA), apresentou o trabalho durante o II Workshop de Astro e Paleobiologia, realizado no IAG (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP (Universidade de São Paulo). Um artigo científico foi recentemente publicado no periódico “Astrobiology”.
Os sinais, encontrados em rochas da Formação Dresser, em Pilbara, no oeste australiano, são conhecidos pelos cientistas pela sigla Miss (Microbially induced sedimentary structures). Em português, estruturas sedimentares induzidas por micróbios.
O resultado apimenta a disputa pela busca do registro mais antigo de vida no planeta Terra. Sinais mais antigos, que chegam a 3,8 bilhões de anos de idade, foram apresentados no passado, mas acabaram contestados por boa parte da comunidade científica.
“Muita gente discorda, pois nem todos os critérios de biogenicidade são satisfeitos”, afirma Douglas Galante, astrobiólogo do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, e um dos organizadores do workshop na USP. “Ainda há muito para ser discutido antes de batermos o martelo nessa questão.”
A TERRA COMO EXEMPLO
Determinar quando as primeiras formas biológicas surgiram na Terra é, evidentemente, uma das questões centrais para o estudo das possibilidades de vida em outras partes do Universo.
Sabe-se que a Terra se formou há 4,6 bilhões de anos, e que passou por intenso bombardeio de bólidos celestes (inclusive, potencialmente, a grande colisão que deu origem à Lua) até cerca de 3,8 bilhões de anos, quando as coisas finalmente se acalmaram no Sistema Solar.
Determinar que a vida surgiu logo após a estabilização das condições ambientais do planeta traz consigo uma premissa poderosa: a vida parece tomar conta de um ambiente tão logo ele se mostra favorável.
Daí os cientistas podem derivar algumas hipóteses: ou a vida já veio pronta do espaço, talvez transportada no interior de meteoritos, e colonizou o planeta assim que foi possível, ou os processos químicos que levam ao surgimento da vida não foram tão complicados e puderam ser realizados num período relativamente curto, logo que as condições planetárias se tornaram favoráveis.
Uma terceira possibilidade — não muito fácil de defender — é que simplesmente demos uma sorte danada, e fenômenos muito improváveis aconteceram aqui na Terra em rápida sucessão para dar origem a todos os organismos vivos que hoje habitam nossa biosfera. Mas não seria um processo que se repete com facilidade.
Qual será a alternativa correta? Ninguém sabe.
O interessante é que as tais Miss representam o trabalho não de uma única espécie de micróbio, mas de uma comunidade complexa de criaturas unicelulares. Um ecossistema microbiano. “Essa comunidades provavelmente existiam quase 3,5 bilhões de anos atrás”, afirma Noffke.
De certa forma, isso indiretamente empurra para trás o momento em que os primeiros seres vivos iniciaram seu reinado sobre o ambiente terrestre e sugere que a vida pode mesmo ser um fenômeno comum no cosmos. Embora, claro, a confirmação dessa premissa só poderá ser feita quando encontrarmos outros mundos com vida ou quando algum cientista conseguir recriar em laboratório todas as etapas exigidas para ir da química simples à complexidade dos organismos vivos.
Por ora, tudo não passa de material para reflexão.
Repercussão: BOL