Portal da Unicamp, em 31/01/2014
“A cristalografia, para mim, é paixão”, diz a professora Iris Torriani, recém-chegada de Paris, onde participou da cerimônia de abertura do Ano Internacional da Cristalografia (IYCr2014) na sede da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), que reconhece assim a importância de uma técnica que vem permeando praticamente todas as áreas do conhecimento. Em Campinas, a docente da Unicamp está ajudando na organização da Reunião de Cúpula da América Latina, que acontecerá no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) de 22 a 24 de setembro, sob o tema “Cristalografia biológica e métodos complementares”.
“A cristalografia ganhou enorme impulso com a descoberta dos raios-X em 1895. A partir de 1912, os aparelhos que inicialmente tinham aplicações médicas passaram a ser usados pela física no estudo de estruturas cristalinas”, explica a docente do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW). “É a área que possui o maior número de prêmios Nobel [23], sendo que todos os laureados – da fisiologia, biologia, química, física – usaram a cristalografia e suas ferramentas como ciência básica”.
Iris Torriani justifica a escolha do local do evento em Campinas por conta dos equipamentos do LNLS, que oferecem uma facilidade única para pesquisadores brasileiros e da América Latina. “O IYCr2014 tem programadas mais duas reuniões de cúpula, no Paquistão e na África do Sul. Há um esforço da União Internacional de Cristalografia [IUCr], que possui atualmente 52 países membros, em aumentar essa representação. Em outubro de 2012 foi realizada a Primeira Reunião Latino-Americana de Cristalografia, em Córdoba, Argentina, e já conseguimos formar a Regional Latino-Americana (Laca), enquanto a IUCr busca adesões no Leste Europeu, África e Sudeste Asiático.”
Os organizadores do Ano Internacional da Cristalografia ressaltam que um objetivo é comemorar o centenário da difração de raios-X, que permite o estudo detalhado da matéria cristalina em nível atômico; o outro é lembrar o aniversário dos 400 anos da observação por Kepler da forma simétrica de cristais de Gelo (1611), dando início a estudos mais profundos sobre o papel da simetria na matéria. Ao longo de 2014, os pesquisadores da área estarão organizando incontáveis atividades pelo mundo. No Brasil, o Instituto de Física da USP já abriu as comemorações em 19 de janeiro, com uma escola sobre “Estrutura de macromoléculas biológicas”; e no Instituto de Física de São Carlos ocorrerá a escola sobre “Refinamento de estrutura de macromoléculas” de 8 a 16 de abril.
Iris Torriani mostra um dos pôsteres promocionais da IUCr/Unesco que celebra, ainda, os 50 Anos do Prêmio Nobel de Química para a cientista britânica Dorothy Hodgkin, em 1964, por suas pesquisas na área de cristalografia de raios-X que revolucionaram o mundo da ciência. “É a nossa laureada mais querida. Dorothy visitou a Unicamp em 1985 e guardamos a foto em frente ao nosso laboratório. Ela foi premiada por duas descobertas extremamente importantes, as estruturas da penicilina e da vitamina B12, além de ser uma das poucas mulheres que ganharam o Nobel.”
A professora acrescenta que o IYCr2014 vai focar principalmente os jovens estudantes, visando mostrar o papel fundamental da cristalografia para o desenvolvimento de diferentes ramos da ciência, como química, mineralogia, física, biologia, medicina, ciência dos materiais, patrimônio cultural e geociências; enfatizar a universalidade e a presença generalizada da cristalografia na vida cotidiana; e atrair esses jovens para o meio científico, sobretudo dos países em desenvolvimento.
A cristalografia na Unicamp
Iris Torriani chegou à Unicamp em 1975, a convite do professor Stephenson Caticha-Ellis (1930-2003), uruguaio que iniciou as pesquisas em cristalografia no IFGW e formou um grupo voltado ao estudo dos defeitos cristalinos, utilizando particularmente a difração múltipla de raios-X, em que era especialista. “Encontrei um laboratório muito bem equipado, mas que ainda não estava totalmente em uso”, recorda a docente. “Contava com muitos alunos de pós-graduação e fui contratada para fazer pesquisa em cristalografia (o laboratório também concentrava a microscopia eletrônica e o estudo de materiais). Muitos alunos foram formados e eles ocupam atualmente cargos docentes e de pesquisa no exterior e em importantes universidades do país.”
A maior satisfação de Iris Torriani está em ver seus ex-alunos espalhados por vários lugares do Brasil e do exterior. “A mais antiga das minhas estudantes de doutorado, Márcia Fantini, é hoje professora titular da USP e me acompanhou a Paris para a abertura do evento da Unesco. A cristalografia do Brasil está muito bem. Desde minha chegada ao país formei parte da Associação Brasileira de Cristalografia (ABCr), da qual fui presidente em três oportunidades e com a qual continuo colaborando como secretária de Ensino. Existem excelentes núcleos de pesquisa em cristalografia pelo país e o Brasil está muito bem representado no exterior.
Visite a página do IYCr2014 (www.iycr2014.org)
Repercussão: Jornal Brasil