15/05/2009 – Correio Popular
Estudos em escala atômica serão feitos em laboratórios com autonomia para gerenciar projetos
O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), que há 12 anos consolida Campinas na vanguarda da pesquisa, passa por mudanças estruturais estratégicas. O objetivo delas é tornar o Brasil ainda mais competitivo no cenário mundial da produção científica. Os especialistas do campus coordenam cerca de 450 pesquisas anuais que exploram a potencialidade de uma fonte energética avançada, única na América Latina, que possibilita estudos, em escala atômica, nas áreas de química, física, engenharia de materiais, meio ambiente e ciências da vida. Agora, os setores internos ganham o status de centros associados.
A novidade foi anunciada, em Campinas, pelo ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Machado Rezende, que participou quinta-feira da cerimônia de posse do novo corpo diretor da Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron (ABTLuS), organização social criada em 1998 para administrar serviços prestados pelos diversos laboratórios que já recorrem à tecnologia.
Um dos novos institutos autônomos é o Centro de Biologia Molecular Estrutural, o CeBiME, fundado em 1999, que passa agora a contar com uma infraestrutura ágil, independente, para desenvolver projetos que envolvem espectrometria de massas, biologia molecular e cristalização de proteínas. Os oito pesquisadores do setor, que dominam linhas da luz síncrotron, conseguem identificar a estrutura de cada célula, saber que reações ela provoca em um organismo e como pode ser usada, por exemplo, na composição de um medicamento. Os conhecimentos passam a ser vitais para o desenvolvimento de produtos da indústria farmacêutica e a prestação de serviços públicos eficientes.
De acordo com o diretor do CeBiME empossado quinta-feira, o cardiologista Kleber Gomes Franchini, o caráter de centro associado permite aos cientistas a aproximação com profissionais que, dentro da comunidade, têm atuação importante na aplicação prática da tecnologia. Ele deu exemplos recentes de convênios firmados que já rendem frutos.
Médicos do Centro Infantil Boldrini firmaram, com o laboratório, um contrato de cooperação científica. Juntos, os especialistas das duas instituições, financiados por bolsas fornecidas por agências de fomento à pesquisa, estudam como um determinado tipo de molécula favorece o câncer. Há outros casos. Especialistas do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) fazem, no campus, a identificação de proteínas causadoras de males cardíacos. Professores universitários de São Carlos vieram a Campinas e recorreram à tecnologia para estudar a doença de Chagas.
“A estrutura do CeBiME está disponível para que pesquisadores do Brasil todo possam realizar estudos avançados”, diz o professor Franchini. É que os recursos disponibilizados pelo governo federal, explica, permitiram a Campinas manter uma estrutura moderna, equiparável às mais avançadas do mundo. Há, entre outros, equipamentos como o de ressonância magnética nuclear, detalhamento genético e biofísica das proteínas, caríssimos, economicamente inviáveis para estudos isolados, em empresas ou universidades.
“A demanda das pesquisas e o fechamento de novos convênios vão permitir que a estrutura se modernize sem parar e que toda a sociedade colha os benefícios do conhecimento”, afirma o diretor. O status de centro associado ainda vai permitir a aproximação com especialistas internacionais sem que as visitas precisem passar pelo crivo burocrático de uma organização institucional gigantesca.
E a modernização se espalha por todos os corredores do LNLS. A exemplo do CeBiME, já funciona de maneira autônoma, no mesmo campus, o Centro de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), que firma convênios com lideranças públicas e privadas interessadas no desenvolvimento de fontes limpas de energia, mercado que não para de crescer, no planeta todo.
A FRASE
“A nova estrutura do polo tecnológico campineiro permite que os laboratórios se transformem em centros de pesquisa de caráter nacional. Produzimos o conhecimento que vai ser usado, pela indústria ou pela universidade, em benefício de toda a população.”
KLEBER GOMES FRANCHINI
Médico, diretor do CeBiME
O NÚMERO
5,5 MILHÕES DE REAIS É o orçamento anual para a manutenção da estrutura de pesquisas do CeBiME.
O QUE É
Luz síncrotron é uma radiação eletromagnética intensa produzida por elétrons de alta energia num acelerador de partículas. A luz síncrotron abrange uma ampla faixa do espectro eletromagnético: raios X, luz ultravioleta e infravermelha, além da luz visível, que sensibiliza o olho humano, são emitidas pela fonte. É com essa luz que cientistas estão descobrindo novas propriedades físicas, químicas e biológicas existentes em átomos e moléculas, os componentes básicos de todos os materiais.
RANKING 2009 – Países com o maior número de artigos científicos publicados
1. Estados Unidos
2. China
3. Alemanha
4. Japão
5. Inglaterra
6. França
7. Canadá
8. Itália
9. Espanha
10. Índia
11. Austrália
12. Coreia do Sul
13. Brasil
14. Rússia
15. Holanda
Fonte: Ministério da Educação
SAIBA MAIS
As pessoas interessadas em conhecer a estrutura e os projetos desenvolvidos nos laboratórios campineiros que exploram as potencialidades da luz síncrotron podem obter informações detalhadas no site www.lnls.br.
Direção ganha aval de especialistas
Indicação dá maior independência e credibilidade junto à comunidade científica
O ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Machado Rezende, anunciou em Campinas que os institutos nacionais de pesquisa passam a ser comandados por gente indicada por especialistas de cada setor. No caso da ABTLuS, os empossados na quinta-feira foram sugeridos por um “comitê de buscas”, formado por conselheiros e cientistas de centros universitários, organizações públicas e privadas.
Para Rezende, o setor se livra de amarras políticas, que definiam diretores sem comprovada competência em determinada área. Na quinta-feira, o engenheiro mecânico Michal Gartenkraut, ex-professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e membro do Conselho Científico do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), assumiu a direção da ABTLuS. O físico Antônio José Roque da Silva, professor titular da Universidade de São Paulo (USP), é o novo diretor do LNLS. O médico Kleber Gomes Franchini, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, assumiu o CeBiME.
O ministro acredita que administração ideologicamente independente tem autonomia para manter projetos, sugerir, debater e executar inovações, sem estar necessariamente ligada ao grupo político que ocupa o poder. Ao governo federal, diz, só cabe tornar a pesquisa viável.
Rezende comemora, por exemplo, o fato de o orçamento anual do Ministério da Ciência e Tecnologia ter saltado de R$ 2 bilhões para R$ 4 bilhões em sete anos. “Cabe ao governante dar aos pesquisadores instrumentos de trabalho que os capacitem a competir com as instituições estrangeiras”, fala. O ministro lembra o levantamento internacional recente que colocou o Brasil no 13º lugar dos maiores geradores de conhecimento científico do planeta. “Passamos a Rússia e a Holanda no ranking. Mas o produto interno bruto e o número de moradores credenciam o Brasil a sonhar mais alto”, diz.
Campinas, especificamente, tem um papel estratégico nesse plano. “Dos 12 países do mundo que possuem produção científica maior que a nossa, dez dominam a tecnologia da luz síncrotron. A cidade é privilegiada”, disse.